quarta-feira, 18 de fevereiro de 2015

JE SUIS CUICÁ

O som da cuíca é um patrimônio imaterial da cultura popular carioca – no mundo não há outro igual
Numa bateria de 280 componentes, são 28 cuícas marcando o ritmo na mesma levada com tons diferenciados
Lá e cá, com uma bossa dobrada no meio
Umas choram, outras riem, a maioria gargalha
Tudo funciona como numa alucinada orquestra de couros
Ao longo de 90 minutos – uma partida de futebol – você toca ali no meio de redemoinho.
Vira também uma cuíca: corpo e instrumento num só embalo
Somos, portanto, homens-cuíca ladeamos por homens-surdo, homens-caixa, homens-tamborim
Mas somos cuícas
Flutuamos...voamos...dançamos...gargalhamos
As cuícas tocam para os chakras dos umbigos das mulatas
As rainhas, quando realmente majestades, se derretem ao som imantado das cuícas da Sapucaí
As bichas enlouquecem
Na fiel bateria da São Clemente cuícas surfam em ondas
O estridente som dos agogôs de quatro bocas nos completam
Há dez anos desfilo na Sapucaí e este ano me senti genuinamente uma cuíca
Mugindo como boi, buzinando como caminhão, abduzido pelo som circulante em êxtase deslumbrante
Cuíca não sente dor, nada pensa: é zen transcendental
Cuíca não sente o tempo passar e faz a plateia delirar
Cuíca não é o principal instrumento, mas é o molho de pimenta
Cuíca bebe água, suor e lágrimas pelo gorgurão
Durante 90 minutos fui uma cuíca e não queria mesmo ser outra coisa, pois o meu som fazia o maior espetáculo da Terra.
Deus salve as cuícas: je suis cuicá