A dança dos milhões
Orlando Senna
Na minha postagem anterior falei sobre o bom desempenho mercadológico do cinema brasileiro em 2013. Sem dúvida os números são expressivos, mas poderiam ser bem melhores se o maior produtor cinematográfico (e audiovisual) da América Latina conseguisse superar dois entraves ao desenvolvimento plenamente satisfatório dessa indústria. Embora a ocupação, este ano, de 18% das salas brasileiras de cinema por filmes nacionais deva ser comemorada, a meta sonhada pelos últimos governos do país (Fernando Henrique, Lula, Dilma) é uma ocupação entre 40% e 50%.
Os entraves mais danosos são a burocracia, enfermidade que atinge toda a máquina estatal (além de ser conduto para a corrupção), e o custo da produção de filmes. Os orçamentos brasileiros são duas vezes maiores, em cálculo otimista, que os argentinos, chilenos e colombianos. São de três a quatro vezes maiores que os orçamentos praticados nos outros países sul-americanos e na América Central. A Espanha faz filmes bem mais baratos que o Brasil. Alguns filmes independentes dos EUA são mais baratos que filmes independentes brasileiros (entenda-se por independente realizações sem vínculos com grandes distribuidoras e/ou corporações midiáticas).
Os produtores culpam o alto custo de serviços e mão de obra, que vêm subindo continuamente nos últimos vinte anos. Absurdamente, enfatiza a produtora Lucy Barreto. A Ancine-Agência Nacional de Cinema crê que os custos cinematográficos estão contextualizados na realidade brasileira, onde os salários aumentaram nas últimas décadas e há carência de mão de obra especializada (e demanda com pouca oferta encarece o produto). O orçamento médio dos filmes longa-metragem brasileiros está entre quatro e cinco milhões de reais (US 1.770.000/US 2.200.000, câmbio aproximado) e o recurso máximo que a Ancine pode destinar a um filme é sete milhões de reais (US 3.100.000). Os filmes com orçamento superior a isso buscam a complementação em outros "guichês" de recursos públicos (editais da Petrobrás, Eletobrás, BNDES, etc) e na coprodução com outros países.
Um aspecto importante nesse panorama é que os filmes brasileiros mais caros, as superproduções, não se pagam nas bilheterias. Pode-se dizer que muitos filmes de baixo orçamento também não se pagam — mas o prejuizo para o contribuinte é bem menor. Exemplos deste ano: Flores raras custou 13 milhões de reais (US 5.750.000) e rendeu pouco mais de três milhões (US 1.330.000). O tempo e o vento custou 14 milhões (US 6.195.000) e rendeu menos de sete (US 3.100.000). Serra Pelada custou dez milhões (US 4.400.000) e fracassou solenemente nas bilheterias. A subida da montanha continuará em 2014. Nosso Lar 2, surfando na onda espírita, está captando 17 milhões (US 7.500.000). Amazônia, coprodução Brasil-França em 3D, custou 26 milhões (US 11.500.000), dos quais 16% oriundos de fundos públicos brasileiros.
Não creio que a questão é fazer ou não fazer filmes caros. Em todas as cinematografias robustas, superproduções, filmes médios e criações experimentais convivem e se retroalimentam. A questão é que todos os filmes brasileiros, pequenos e grandes, estão com orçamentos conflitantes com o mercado, todos estão caros para a nossa realidade e cada um deles está caro em relação às suas possibilidades de arrecadação. Binômios essenciais do capitalismo, como custo/benefício e oferta/procura, estão sendo ignorados. Uma palavra às autoridades e empresários responsáveis pelo andar da carruagem: cuidado.
Por Orlando Senna
* Link para outros textos de Orlando Senna no Blog Refletor http://refletor.tal.tv/tag/orlando-senna
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