segunda-feira, 22 de agosto de 2016

O CARIOCA FOI MEDALHA DE OURO NAS OLIMPÍADAS

Luis Turiba

Somos cariocas, somos antropofágicos. Temos um jeito especial de ser e se sentir terráqueos privilegiados. Vivemos, moramos e circulamos em uma cidade de geografia mágica, cujo visual é Patrimônio Cultural da Humanidade. Aqui reina um deus dançante que chamamos samba, e o povo tira onda em esgoto a céu aberto. Temos sotaque acentuado em "ésssex" e inventamos tiradas que, rapidamente, se tornam transcontinentais. Carioca se alimenta de biscoito Globo na praia e acha fofo. Considera argentino hermano, e Copacabana é centro do planeta. Em cada passo que dá na amada cidade de São Sebastião, reflete seu humor/amor ao mar e às praias; a morros e montanhas, no sempre céu azul onde habita outro deus, o Sol, com seus sons, sais e suores de um eterno verão. A autoestima aqui é estratosférica, perigosa, transcendente. Afinal, não foi à toa que Walt Disney batizou um papagaio de Zé Carioca. Que o diga nosso prefeito canguru.

A origem do nome carioca é indígena, mas se tornou mestiça como os nossos campeões de ouro, bronze e prata nesta Olimpíada. O pintor Pedro Américo deu o nome de "A carioca" a um óleo sobre tela feito em 1882, onde uma índia curvilínea aparece totalmente nua penteando longos cabelos. A "Garota de Ipanema" é carioca, invenção de Vinicius e Tom. A origem etimológica está em duas palavras da língua tupi: kara'iwa ("homem branco") e oka("casa"), que, juntas, identificam os portugueses. Os índios passaram a usar a expressão com a fundação do Rio de Janeiro. Há uma outra tese que considera a existência de uma aldeia tupinambá chamada Kariók, no sopé do Outeiro da Glória.
Independentemente de nomenclaturas, carioca fala alto e cultiva a turistada. Resiste, luta e ocupa com humor seu habitat já muito poluído. Afinal, sempre que o Rio recebe um desses mega eventos — Rio + 20, Jornada da Juventude, Copa do Mundo e, agora, os Jogos Olímpicos —, a cidade se engalana com programas, projetos e novos espaços extraordinários que parecem, às vezes, esquecer o cidadão comum, o gentílico carioca e suas práticas culturais. Mas nós caímos dentro e, antropofagicamente, nos tornamos "donos" da parada. Passamos a torcer com intimidade por Bolts e Phelps como se fossem atletas da Mangueira ou vizinhos da Rafa na Cidade de Deus. Fazemos macumba pra derrubar francês pulador. E isso o "NY Times" vai ter que engolir.
Nesta Rio 2016, independentemente das reais transformações (VLT, Boulevard Olímpico, Cidade Olímpica etc), maquiagens e photoshops, a cultura carioca vem se destacando nos estádios e para além dos grandes palcos. Damos sabor especial aos grandes espetáculos. Os artistas de rua, por exemplo, são verdadeiros medalhistas da sobrevivência com seus passinhos, grafites, cânticos, rodas de samba, rap/poesia, marchas e performances coletivas que prosseguirão no universo pós-olimpíco da nossa gente indiscreta, espalhafatosa e marcante. O carioca vai deixar saudade.

Foto de Durvalino Couto.

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