quinta-feira, 12 de março de 2015

TÁ DIFÍCIL, MANO!

Luis Turiba


Jovem, negromestiço e morador de uma quebrada qualquer em uma grande cidade brasileira. Esta condição já é quase um atestado de culpa ou um passaporte para a desexistência. Pouco importa se trabalha ou estuda. Nossa juventude corre risco.

No meio caminho não há somente pedras ou esgoto a céu aberto. Assim, do nada, você pode ser alvejado na puxada do gatilho e no estampido do cão. Fiquem espertos. Ou, na melhor das hipóteses, ser algemado e enjaulado como cachorro louco num desses camburões que lembram navios negreiros da pós-modernidade. Aí, é trauma para sempre ou um X a mais nas estatísticas.

Tá difícil, Mano; reconheço. Nos últimos tempos tem acontecido quase de diariamente como uma chuva de balas perdidas. Os confrontos se multiplicam especialmente nas áreas de chapa quente. Em alguns casos, o assunto chega à televisão, ao noticiário como recentemente, quando soldados foram presos por fuzilar um jovem na Palmeira e o Comandante do Batalhão exonerado por tentar confundir o mal-feito com o direito. Semanas atrás, uma passeata de jovens indignados foi dissolvida à bombas, porrada e tiros, transformando a Maré numa espécie de Soweto do século XXI. É muito ONG pra pouca onda. Dois corpos ficaram no chão. Esse estado de barbárie (falamos do Estado Ismalico, mas tantas vezes ela está em nosso próprio quintal) trás dor, medo e pavor para dentro dos nossos lares. É um Rio de Janeiro nada glamoroso, especialmente quando uma mãe aguarda a chegada do seu filho que, como milhares de outros jovens de 20 anos, foi a praia com a galera e terminou sendo levado ao bofetões para uma delegacia no Leblon acusado por um roubo do qual não faz a menor ideia. E o mais grave: da rua até a DP, ficou sem o celular, o anel e o cordão do pescoço. No fim, o delegado mandou soltar, pois nem passagem ele tinha: mas e daí?  Dentro da lógica do absurdo, talvez tenha tido até sorte.

"Rio de ladeiras, civilizações, encruzilhadas/ cada ribanceira é uma nação". Esse verso de Chico Buarque revela a nova geografia carioca que não está nos cartões postais. É nesse ambiente que o extermínio planta suas raízes. O assunto está na ordem do dia da Segurança Pública do Rio e de outras grandes cidades, como Salvador. Como escreveu Marcus Faustini  em recente crônica: "A naturalização da morte de jovens de origem popular no Rio precisa ter fim, antes que morra a força pela mudança de quem fica." Ainda é possível não exterminar a esperança.


Luis Turiba, jornalista e poeta


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