quinta-feira, 8 de maio de 2014

JAIR RODRIGUES: DISPARADA NO MEU CORAÇÃO


Luis Turiba

Nunca pensei que Jair Rodrigues estivesse tão próximo da nossa  consciência existencial. Hoje me dei conta disso e chorei muito sua partida. Não consegui ouvir outra musica a não ser Disparada, de Téo e Geraldo Vandré, vencedora do Festival de Canções da TV Record, em 1966. Ouvi pelo menos umas dez versões, mas a que marcou nossa geração foi aquela do festival. Sua interpretação despertou em cada um de nós um Che Guevara adormecido.
Já se passaram 48 anos e o vídeo que postamos no facebook nos leva a nostálgica viagem no tempo/espaço/consciência.
Embora tenha ficado conhecido como cantor de sambas e até chegou a ser chamado de "inventor do rap nacional", Jair Rodrigues nos ensinou a gostar de MPB, do Brasil e da revolução. Foi o companheiro-primeiro da pimentinha Elias Regina, o que é uma grande creencial. Depois, pelo repertório brasileiramente energético que escolheu para se inserir no contexto da MPB da década de 60.
Mas Disparada nos marcou profundamente. Era uma toada rural e moderna com um pique incrível; um rio São Francisco em plena seca do Nordeste; um pedido musical de Reforma Agrária, um hino do MST, uma foto de Sebastião Salgado, um grito pelo que viria a ser a desumana guerrilha do Araguaia. Disparada fazia parte do repertório do Movimento Estudantil que tanto trabalho deu a ditadura militar. Cantávamos a plenos pulmões. "Porque gado a gente marca/ tange ferra engorda e mata/ mas com gente é diferente."
Eu, moleque, morava no Meier quando o vi cantar na TV, Record. Tinha 16 anos. Aquela música quente, forte, pra cima e pra dentro fez minha cabeça. Me emocionei e juro: tive meu primeiro surto de brasilidade revolucionária. "A  morte, o destino tudo/ estava fora do lugar/ eu vivo pra consertar." Mas nem consciência tinha disso.
Hoje, revendo o vídeo da sua apresentação no Festival, dá para anotar muitos detalhes históricos inacreditáveis. O músico que o acompanha elegantemente de smoking, tocando xikerê numa arcada de bode, marcando as chicotadas no gado. A violinha logo no início da canção. Há um momento em que Elis Regina é focada vibrando e pulando com todo o público. Os rapazes do MPB4 olham um tanto impactados a apresentação. E no finalzinho da música, Chico Buarque e Nara Leão, que apresentaram a Banda e dividiram com Jair Rodrigues o primeiro lugar no Festival, chegam junto para também agradecer o louvação de quem deve ser louvado.
Pois é Jair, deixem que digam, que pensem, que falem: deixa isso pra lá, vem pra cá, o que que tem: eu não tô fazendo nada, você também: vem cá bater um papo assim gostoso por alguém. Você nos marcou, negão; e nosso coração continua em Disparada.  

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