terça-feira, 29 de janeiro de 2013

INDIZÍVEL



Foi mais ou menos assim que fiquei: indizível

Texto de Viviane Mosé sobre a tragédia de Santa Maria

"não tenho conseguido levar meus dias adiante. uma asfixia, uma dor. por isso tento aqui puxar a ponta desse fio, compartilhando com vocês a tentativa de falar dessa agonia. um prego no meio do peito que não jorra sangue, apenas vazio. um novelo de lã atravessando a garganta. uma nuvem escura pairando no céu mesmo quando há sol. penso em minha mãe e no seu colo quente. e me lembro que já não me cabe. é o meu colo de mãe que agora acolhe e aquece outro corpo. mas em meu corpo hoje nada cabe senão a imagem dos pais sem os filhos. dos filhos estendidos no chão sem vida. não tem cabimento esta dor coletiva rasgando a alma. rasgando o chão que se desfaz sob os pés. me lembro da fragilidade da vida e da irresponsabilidade da cultura com a vida. o descuido, o desvalor da vida. então o que vale, a fama, os nomes próprios, as contas bancarias, o domínio de uns sobre outros? o que de fato vale se não vale a vida? quanto custa a tragédia de Santa Maria? minha dor vem da exposição de uma ferida que se chama o impalpável, o impagável, o indizível."

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