O samba em torno do coreto
Luis Turiba*
A Praça São Salvador, incrustada entre os bairros do Flamengo, de Laranjeiras e o Largo do Machado, é a mais interiorana – e paradoxalmente, também a mais cosmopolita – da Zona Sul do Rio de Janeiro.
Quase tudo nesse logradouro gira em torno de um lindo e tradicional coreto central e do chafariz imperial. Ambiente singelo, mas com uma rotação que alcança decibéis de grau máximo! A pulsação ali é permanente, com direito a sirenes do Corpo de Bombeiro localizado na boca da praça e à doçura das flautas dos chorões que fazem a festa todos os domingos, alimentada pelas geladíssimas caipiroskas de frutas do Luisinho.
Como boa praça do interior, dezenas de crianças brincam de bola e skate no parquinho e fora dele; vizinhas jogam conversa fora, carrocinhas de pipoca, pizzas e outros quitutes complementam o cenário dos vendedores de cervejas. Galeras papeiam aqui e ali.
Os bares do entorno sempre lotados de saudáveis e históricos bebuns. Casais de jovens namorados – do mesmo e de sexos diferentes- se pegam como bem podem enquanto o lindo chafariz refresca a rapaziada. A música rola à vontade para dar combustão ao ambiente: blues, chorinhos e muitos sambas. No meio de toda essa muvuca, desconfie do carro de vidros fumê estacionado com um casal no banco de trás fazendo curvas corporais que nem Niemeyer imaginaria.
Na mais democrática roda de samba que acontece aos sábados a partir das 19h; onde todo mundo toca e muita gente se desentoca, criou-se uma tradição muito próxima daquelas dos pubs londrinos: hora de terminar, é pra findar messssmo! Desliga-se o som e pronto. O acordo com os moradores permite que os acordes do samba vá até às 22h. Nem um minuto a mais. E os sambistas não querem confusão com a vizinhança.
A roda é super-bem organizada dentro da maior diversidade. Os ritmistas trazem seus instrumentos – agogôs, chocalhos, tamborins e cuícas – e banquinhos onde se sentam. Quando bate 21h30m, Jonatas Alburquerque, um dos coordenadores, sai pela praça com seu chapéu de palha na mão recolhendo o "trocadinho" que irá ajudar nas despesas com a mesa de som.
"Hoje tivemos aqui quase 60 mil pessoas", anuncia, cariocamente, o animador do pagode. Oficialmente, estima-se uma média de 600 a 800 pessoas a cada noite de sábado em torno do coreto. Turistas são bem vindos e alguns ousam batucar. A "furiosa" mantêm o ritmo como pode.
A roda segue preguiçosamente ao som de "Amélia" e outros sambas de Silas de Oliveira, Paulinho da Viola e Martinho da Vila. A mulherada vai se soltando e caindo pra dentro da roda, remelexendo-se cada qual a sua maneira.
Assim é o "Batuque no Coreto, Pelo Samba Para Ser Feliz" da Praça São Salvador, com pessoas de todas as idades cantando, dançando e tocando memoráveis sambas como se o tempo não tivesse passado.
Sábado passado, a banda "Me engana qu´eu gozo" optou por atacar umas conhecidas marchinhas do passado. Foi um furdúncio só. A galera pulou de suar, antecipando o carnaval que já começou na Praça São Salvador.
*Luis Turiba é poeta e cuiqueiro
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