Clóvis Brigagão*
Nas últimas semanas milhões de brasileiros do Oiapoque ao Chuí trouxeram a política brasileira para as ruas! A democracia conquistada nos duros e difíceis tempos da ditadura, passou as últimas quase 3 décadas aos trancos e barrancos. E chegamos ao ponto de não retorno?. Somos os que pagam os mais altos impostos no mundo (sem benefícios), sustentamos juros estratosféricos, enganados pelas promessas fáceis dos políticos às vésperas das eleições obrigatórias, sustentando, a duras penas, quando ainda se pode,planos de saúde privados já que a saúde pública... eu disse saúde pública? e a lista se alonga e o povo brasileiro ali, trabalhando, dia pós dia, pacientemente, usando meios de transportes caros e insuportáveis e tudo mais que sabemos aguentar no suado lombo, a sonhar com dias melhores...promessas que nos passam como se a Justiça fosse apenas uma quimera inalcançável!
Mas que basta! Tem sido a resposta dada por essa grande massa – de todo tipo de gente - ,aparentemente sem foco, irradiado através da conjunção da estética da revolta necessária com o grande acelerador da mobilização apoiada hoje pela expansão das redes digitais.Reunidos em praças públicas – já dizia o poeta que a praça é do povo -, espalhados pelas principais avenidas das grandes e médias cidades brasileiras, mais de 100 – os brasileiros bradam palavras – sem conotação político-partidária -que vão bater e ecoar nos Palácios (parece que ainda não saímos dos palácios imperiais) e locais do poder republicano brasileiro.
Com clareza límpida as palavras de ordem e a disposição desses milhões de indignados (pois se trata de uma imensa indignação) entrelaçam todo o potencial de revolta contra a desigualdade que deságua das escadarias, dos corredores e das salas das várias instâncias do poder institucional brasileiro.
Mas cuidado, muito cuidado! Pois, toda essa energia que, potencialmente, nasceu de uma reivindicação sobre aumento de tarifas de ônibus, alastrou-se por todos os campos das políticas públicas empobrecidas e fragilizadas pela força do Poder – educação, saúde, corrupção e desdém do poder público com os seus cidadãos - aparentemente inabaláveis, poderá deixar passar o momento e cair, ingenuamente, em mais um sonho de tornar o Brasil um país sério que se leva em consideração a revolta digna de seu povo que, destemido, vai para as ruas defender seus direitos e suas necessidades básicas que não são ouvidas e respondidas pelas autoridades do país. Gostei e repetirei o que um jornalista de El País viu em um cartaz da manifestação popular brasileira: "país mudo é um país que não muda". É saudável continuar a se indignar e a gritar pelos nossos direitos fundamentais.
*Cientista Político, professor do IUPERJ e professor visitante da UERJ.
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