segunda-feira, 5 de março de 2012

TRECHOS DO POEMA "ALTAZOR", DE VICENTE HUIDOBRO

ALTAZOR
Trechos do Canto II, uma declaração de amor
Tradução de Antônio Risério e Paulo César Souza
Mulher o mundo está mobiliado por teus olhos
Faz-se mais alto o céu em tua presença
A terra se prolonga de rosa em rosa
E o ar se prolonga de Paloma em Paloma
Ao partires deixas uma estrela em teu lugar
Deixas cair tuas luzes como o barco que passa
Enquanto te segue meu canto encantado
Como uma serpente fiel e melancólica
E volves a cabeça por trás de algum astro
(…)
As planícies se perdem sob tua graça frágil
Perde-se o mundo sob teu andar visível
Pois tudo é artifício quando te apresentas
Com luz perigosa
Inocente harmonia sem fadiga nem esquecimento
Elemento de lágrimas que gira para dentro
Construído de medo altivo e de silêncio
(…)
No entanto te advirto que estamos costurados
À mesma estrela
Estamos costurados pela mesma música estendida
De um a outro
Pela mesma sombra gigante agitada como árvore
Sejamos este pedaço do céu
Este trecho em que se passa a aventura misteriosa
A aventura do planeta que estala em pétalas de sonho
(…)
Tenho uma atmosfera própria em teu alento
A fabulosa segurança de teu olhar com suas constelações íntimas
Com sua própria linguagem de semente
Tua fonte luminosa como um anel de Deus
Mais firme que tudo na flora do céu
Sem torvelinhos de universo que empina
Como um cavalo por causa de sua sombra no ar
(…)
Achei-te como lágrima num livro esquecido
Com teu nome sensível desde antes em meu peito
Teu nome feito do ruído de palomas que voam
Trazes em ti a lembrança de outras vidas mais altas
(…)
Minha alegria é olhar-te quando escutas
Esse raio de luz que caminha até ao fundo da água
E ficas suspensa um bom tempo
(…)
Minha glória está em teus olhos
Vestida do luxo de teus olhos e de seu brilho interno
Estou sentado no ponto mais sensível de teu olhar
Sob o silêncio estático das pestanas imóveis
Vem saindo um augúrio do fundo de teus olhos
E um vento de oceano ondula tuas pupilas
Nada se compara a esta lenda de sementes que deixa tua presença
A esta voz que busca um astro morto a que dar vida
Tua voz faz um império no espaço
E esta mão que se levanta de ti como se fosse pendurar sóis no ar
E este olhar que escreve mundo no infinito
E esta cabeça que se inclina para escutar um murmúrio na eternidade
E este pé que é a festa dos caminhos encadeados
E estas pálpebras onde vêm encalhar as centelhas do éter
E este beijo que incha a proa de teus lábios
E este sorriso como um estandarte à frente de tua vida
E este segredo que dirige as marés de teu peito
Adormecido à sombra de teus seios
Se tu morresses
As estrelas apesar da lâmpada acesa
Perderiam o caminho
Que seria do universo?
FIM

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