segunda-feira, 30 de junho de 2014

BRASIL VENCEU COM A FORÇA DO PRETO VELHO

 Luis Turiba


"DANEM-SE OS PESSIMISTAS
ESSES JAMAIS ALCANÇARAM O ORGASMO CÔSMICO"


Sou torcedor. Futebol para mim é paixão e não lógica ou política. Torço pela seleção desde menino e vou continuar torcendo. Já torcia em 1970 em plena barra pesada da ditadura militar de Garrastazu Médici. Estudante, sai do Rio perseguido e fui assistir e torcer o jogo final contra a Itália, quando vencemos por 4 a 1, com show de Pelé.

Aquela amarelinha tem história para mim e para minha geração. Já chorei de decepção quando o time de Zico, Júnior, Sócrates, Falcão e Toninho Cerezo deixou a Copa escapulir também contra a Itália, em 1982.

Como torcedor  apaixonado, sempre acreditei no "Sobrenatural de Almeida" de Nelson Rodrigues. E nesse jogo contra o Chile, ele atuou de Preto Velho protegendo nosso gol, já que a defesa não conseguia. Bola da trave aos 44 do segundo tempo foi coisa do Preto Velho. Júlio César pegou dois penaltis, mas o Preto Velho desviou o outro para a trave. 

Nelson Rodrigues escreveu em outubro de 1968: "Dizia Horácio que há mais coisas entre o céu e a terra do que supõe a nossa vã filosofia. Esta aí uma clara alusão ao Sobrenatural de Almeida (...) Os idiotas da objetividade não vão além dos fatos concretos. E não percebem que o mistério pertence ao futebol. Não há clássico e não há pelada sem que o mínimo de fantástico se faça presente."


E nós seguimos torcendo apaixonadamente enrolados em nossos parangolés. Adelante Felipão! Adelante Seleção. Que venga la Colombia. Nada nos assusta! Sobrenatural de Almeida está do nosso lado. Isso está escrito desde os tempos de Nelson Rodrigues.

sexta-feira, 27 de junho de 2014

Fwd: Orlando Senna - O lado luminoso da bola

O lado luminoso da bola


por Orlando Senna


A Copa do Mundo 2014 terminou a fase de grupos ontem, dia 26, com a classificação de 16 países, metade dos que iniciaram a competição. Começa amanhã, dia 28, as oitavas de final, da qual sairão oito países para as quartas de final e, em seguida, restarão quatro países para disputar as semifinais e a final. As oitavas são consideradas a fase mais cruel, é o mata-mata, quem perde sai. Muita coisa ainda pode acontecer até o encerramento no dia 13, mas o perfil desta Copa já se delineou. Um perfil que engloba a igualação técnica, tática e física das equipes de países com tradição em Copas, antes tidos como os grandes do futebol, e dos que eram tidos como pequenos, e a nitidez com que se apresentou o conceito de "futebol moderno" nos estádios do Brasil. As frases mais ouvidas até agora das comissões técnicas foram "não existe mais jogo fácil" e "não existem mais times bobos".

O "futebol moderno" que está nos estádios e na boca do povo não tem o sentido clássico da mesma expressão, referindo-se à regulamentação geral desse esporte na Inglaterra, em 1836, quando cidades jogavam com regras próprias, impedindo torneios entre os times. Creio que a definição correta seria futebol contemporâneo e tem a ver com a evolução natural desse esporte ao longo de quase dois séculos e, principalmente, com o avanço veloz das tecnologias científicas e audiovisuais nas últimas décadas. Essas tecnologias criaram condições para uma preparação exponencial dos atletas e dos sistemas táticos e estiveram (estão) ao alcance de países pobres e em desenvolvimento, gestando o nivelamento técnico-tático-físico de seus times.

O futebol mantém seus princípios e suas regras essenciais, o que mudou foi a maneira de aplicá-los. Mantém seus fundamentos (passe, chute, cabeceio, controle, condução, drible, domínio, marcação), o que mudou foi o modus operandi, foi como potencializar, maximizar, o passe longo e a visão de jogo, o drible curto e a posse de bola, os esquemas táticos e o vigor dos jogadores percorrendo 12 quilômetros em uma partida e atingindo a velocidade máxima de 45 quilômetros por hora, com preparo físico superior a maratonistas e velocistas. Os desenhos táticos criaram novas relações de entendimento e distância entre defesa, armação e ataque (na trilha, por exemplo, do jogo envolvente da seleção da Holanda 1974, a Laranja Mecânica, e do tique-taque do Barcelona e da seleção espanhola dos últimos anos). Enfim, um futebol ao mesmo tempo mais rápido e mais cerebral, superando ou unindo as vertentes do futebol-arte e do futebol-força, que disputaram a supremacia durante anos.

Menciono dois cases da fase de grupos: EUA, país grandão considerado futebolisticamente um anão, e Costa Rica, país pequeno em todos os sentidos, inclusive no futebol. Nos EUA aconteceu a conquista de um vasto público onde antes havia pouco interesse pelo "esporte bretão", apesar do esforço de empresários, da contratação de Pelé e Beckenbauer para jogarem no New York Cosmos, de sediar a Copa de 1994. O desinteresse persistiu até a vitória de 2 a 1 dos EUA sobre Gana e recrudesceu, como em um passe de mágica, no empate dramático com Portugal. A partir daí, multidões se reuniram em praças e clubes para ver e celebrar os jogos. A Casa Branca recebeu uma petição pública, com milhares de assinaturas, solicitando que fosse decretado feriado nos dias de jogo do time dos EUA. Quem iria imaginar? Sabemos que a cultura dos EUA é essencialmente ligada à competição e à vitória e o fato do time deles ter condições reais de ser campeão do mundo mudou a relação com esse esporte. 

Antes da Copa, o diagnóstico da mídia e da opinião esportiva era que Costa Rica era "presa fácil", os adversários iam aproveitar para fazer saldo de gols. Ainda mais porque estava no Grupo da Morte, com três campeões mundiais pela frente. Passou por cima dos três, brilhou intensamente, está nas oitavas. Sempre existiram as "zebras", os times que surpreendem, mas já não se trata disso, se trata de qual dos times, todos igualados tecnicamente, tem mais inteligência e habilidade instintiva. O espetáculo mudou e acho, depois de ficar atento a mais de dez Copas, para bem melhor. Uma amiga tica, ou seja, costa-riquenha, leu minha última postagem aqui, O lado escuro da bola, e mandou um e-mail interessante: "escreva sobre o lado luminoso: Costa Rica". Pois é, luminoso.

 


O RIO NA COPA

ARRÁ..URRÚ...O MARACA É NOSSO

 

Luis Turiba

 

O Maracanã é uma feijoada completa: carne seca, pé de porco, linguiça, farofa, couve, arroz, laranja e muito molho de pimenta. Cheira à beça seu tempero, produz barulhos, mexe com os nervos da galera e o bicho pega.

 

Ver jogo em estádio é totalmente diferente da televisão.  Você não é só um assistente confortável sentado no sofá, mas um partícipe ativo em um espetáculo que envolve milhares e milhõe$. No Maraca... benzâ Deus, essa sensação se quadruplica. É como estar numa rave em pleno vôo de um disco-voador rumo ao buraco negro do gol. E trate de aproveitar, pois o embalo dura só 90 minutos e o tempinho de prorrogação. Mas é suficiente. Você não chuta, é verdade; mas empurra o chute, dando-lhe força, direção e potencia com seus gritos, bandeiras, impulsos.

 

Nada vem digerido, tudo é pura dialética. A disputa acontece ali em campo em torno de uma bola – a Brazuca -, na força atlética do aqui e agora.  A dimensão geo-física-espacial é totalmente outra da costumeira telinha. A bola é mais redonda, os passes são mais precisos, os dribles têm mais magia. É dessa imprevisibilidade apaixonante que nasce a tensão que só o futebol desperta em todo e qualquer lugar do planeta Terra. A Fifa apenas potencializou essa energia. Ou melhor: comercializou esse grande negócio chamado Copa do Mundo.

 

Aos 64 anos o Maracanã está enxutaço. Nasci com ele, por isso falo com certidão de nascimento debaixo do braço. Sei que custou caro e fez a vida de muita gente. No embalo da corrupção, o "maior do mundo" passou por reformas profundas e estéticas. Implantou cabelos, fez lipo, ponte safena, prótese. Está tudo funcionando.

 

Fui lá testar. Tudo a contento. Cercado de grades e polícias para os jogos da Copa. É muita gente trabalhando pra te receber, te orientar, te encaminhar, te acolher. Voluntários de megafones nas mãos falando e se comunicando em vários idiomas. Até na hora do clássico xixi, tem um cara ali te orientando. Ah...e os banheiros novos. Exalam perfume. Foi no banheiro que ouvi a frase do jogo: "Pô, que banheiro cheiroso, perfumado! Deixa a torcida do Flamengo vim aqui. Vão roubar tudo isso". Que maldade, gente! A Alemanha jogou e ganhou com a camisa do Mengão.

 

Arrá..urrú...O Maraca é nosso! Voltar ao velho e bom Maraca numa Copa do Mundo no Brasil é demais prum pobre torcedor. Me coube no grande latifúndio da Fifa o jogo França x Equador. E lá vou eu todo-todo vestido de equatoriano. Como "eu sou apenas um rapaz latino-americano sem dinheiro do banco", vesti minha camisa amarela, joguei minha toalha rubro-negro no ombro e lá fui em família, filho e neto.

 

Ora, se o Hino Nacional cantado juntinho emociona, imagina La Marseillaise. Milhares de franceses vieram ao Rio para ver a "Le bleu" se classificar para as oitavas-de-final. Pensem na cena: Maraca lotado e vibrante: quando se entoou as primeiras notas do clássico hino francês, a torcida veio junto cantando como se estivesse indo para uma guerra. A Marseillaise é um hino universal, forte e libertador. Como um ingrato torcedor do Equador, não resisti e cantei junto a plenos pulmões. Me senti o próprio "partisan" da Resistência francesa caminhando pelas montanhas para combater soldados nazistas, com minha espingarda caseira em punho. Allez le bleu! Allez le bleu! Mas vamos à letra do hino cantado em uníssono pelo Maraca lotado:

 

Allons enfants de la Patrie/ Le jour de gloire est arrivé/ Contre nous de la tyrannie/ L'étendard sanglant est levé (2x)/ Entendez vous dans les campagnes/ Mugir ces féroces soldats/ Ils viennent jusque dans vos bras,/ Egorger vos fils, vos compagnes.
E o famoso refrão: A"ux armes citoyens! Formez vos bataillons!/ Marchons, marchons/ Qu'un sang impur abreuve nos sillons."

 

Foi um grande momento da Copa do Mundo que já teve quase tudo: brochada dos campeões espanhóis; fracasso do metrosexual Cristiano Ronaldo; surpresa dos latinos americanos; mordida do vampiro Suárez; balé do magrela Neymar; recordes de gols; invasão de argentinos, chilenos e mexicanos; o time do Flalemanhã; gol-vôo do holandês Persie; greve financeira de jogadores de Gana que acabaram recebendo (via mala diplomática) U$ 6 milhões num hotel em Brasília; passeatas dos "não-vai-ter-Copa" em plena Copa; vaias da elite branca à presidente Dilma; bundalelês em Copacabana e gringos para todos os lados.

 

Posso garantir que o Maraca está pronto para voltar a ser o maior do mundo.  Chega-se rápido e tranquilo de metrô. A saída também foi maneira. Lá dentro, cadeiras confortáveis, lanches merecas e baratos, cerveja gelada. O burburinho do estádio com seus gritos de guerra é contagiante. O huuuuummmm quando a bola passa raspando a trave continua afiado. O colorido das torcidas é arrepiante.

 

Nós, brasileiros, somos realmente o melhor do Brasil na Copa- mesmo aqueles que torcem contra e jogam pedras. Mas independente de tudo isso, presenciei alguns mijões atuando atrás das pilastras (fora dos banheiros) no anel superior do Maracanã.

Pois então: o tão carioca "Imagina na Copa" é hoje uma canção planetária de sucesso. Está todo mundo curtindo e o bicho está pegando. Acontece como um clipe cibernético de vitórias e alegrias; dramas e derrotas; angustias e explosões; choros e surpresas. Gols de placas e gols contra. A bandeira nacional pintada na bunda daquela rechonchuda morena no cangote de um gringo na FanFest de Copacabana. De um lado, a ordem. Do outro, o progresso. Chegou a hora dessa gente bronqueada mostrar seu valor, marcar seu gol. Quem será o campeão? Torçamos pelo Brasil, mas se não...pouco importa: o Maracana é nosso. Ah rá! Uh rú!! 

 

 

terça-feira, 24 de junho de 2014

Fwd: Flip 2014 abre venda de ingressos e anuncia mesa bônus com Mathieu Lindon e Silviano Santiago

 Flip 2014 abre venda de ingressos e anuncia mesa bônus com Mathieu Lindon e Silviano Santiago

Público terá acesso gratuito à transmissão ao vivo da programação principal em telão na praça da Santa Casa e ao show com Gal Costa

Os ingressos para a Flip 2014 começam a ser vendidos no dia 30 de junho, a partir das 10h. O preço da entrada para a programação principal na tenda dos autores, como no ano passado, é de R$ 46,00 (inteira) e R$ 23,00 (meia).

Neste ano, reforçando sua política de democratização de acesso, a Flip traz duas novidades. O show de abertura, com a cantora Gal Costa, pela primeira vez será gratuito e ocorrerá na praça da Matriz, no palco da tenda da Flipinha.

A transmissão ao vivo da programação principal no telão também será gratuita pela primeira vez. Aberta ao público, ocorrerá na praça da Santa Casa, na saída da tenda dos autores. "As duas mudanças são resultado da evolução do projeto de arquitetura da Flip, com o objetivo de ampliar o acesso ao conteúdo das mesas literárias, bem como valorizar os espaços públicos da cidade de Paraty.", afirma Mauro Munhoz, diretor-presidente da Associação Casa Azul, que realiza a Flip.

Novidades na programação

A programação da Flip vai receber dois novos autores numa mesa bônus a ser realizada na quinta-feira, 31 de julho. Somam-se aos 41 convidados já divulgados o escritor francês Mathieu Lindon e o brasileiro Silviano Santiago. Na mesa intitulada Porque era ele, porque era eu, amizade, contracultura, drogas, paternidade, aids, amor gay e suas representações literárias estarão em discussão entre os dois, ambos autores de livros que rememoram amizades marcantes em suas vidas.

Em O que amar quer dizer, que a Cosac Naify vai lançar por ocasião da Flip, Lindon repassa os anos de convivência com o filósofo Michel Foucault (1926-1984), na Paris dos anos 1970 – em  festinhas no apartamento de Foucault na Rue de Vaugirard eles tomavam drogas, davam festas e cultivaram uma intensa amizade que em grande medida supria as lacunas afetivas entre Mathieu e seu pai, Jérôme Lindon, o mítico editor das Éditions de Minuit.

A amizade também é o foco de Mil rosas roubadas (Companhia das Letras), que Silviano Santiago, um dos intelectuais mais respeitados do país, escreveu sobre Ezequiel Neves (1935-2010), jornalista e produtor musical que articulou o estouro da banda Barão Vermelho, nos anos 1980. Drogas lisérgicas, o medo da aids, que matava amigos como Cazuza, a vida intelectual e suas conexões com a contracultura são alguns dos pontos em comum com o livro de Mathieu Lindon.

Quem também passa a integrar a programação da Flip 2014 é o cartunista Claudius, que na sexta (1/8) estará na mesa 5, O Guru do Meiér, ao lado do jornalista Sérgio Augusto e do caricaturista Loredano. Claudius começou sua carreira no Pif-Paf, "semanário de quinze em quinze dias" publicado por Millôr em 1964.

Como comprar

Os ingressos podem ser adquiridos na internet no site da Tickets for Fun (www.ticketsforfun.com.br) ou em seus pontos de venda credenciados; pelo telefone 4003-5588 e nas bilheterias do Citibank Hall de São Paulo e do Rio de Janeiro, das 12h às 20h, diariamente. Os ingressos estarão disponíveis para venda até o dia 29 de julho. Durante a Flip, entre 30 de julho e 3 de agosto, a venda será realizada só em Paraty, na bilheteria oficial localizada na tenda dos autores.

Por conta da alta procura por ingressos, a organização recomenda cadastro prévio no site da Tickets for Fun para quem for adquirir os ingressos pela internet. Para tanto é necessário telefone, RG, CPF e endereço completo. O limite é de dois ingressos por mesa para cada comprador mediante apresentação do CPF do mesmo.

Flip 2014

Neste ano, a Flip será realizada entre os dias 30 de julho e 3 de agosto e homenageará o escritor e cartunista Millôr Fernandes. A programação completa você encontra aqui (http://www.flip.org.br/flip2014.php).

 

Quem faz a Flip

A Casa Azul é uma organização da sociedade civil de interesse público, que desenvolve projetos nas áreas de arquitetura, urbanismo, educação e cultura. Desde as primeiras ações, mantém uma intensa relação com a cidade de Paraty. A Flip e os projetos educativos permanentes – Flipinha, FlipZona e Biblioteca Casa Azul – são algumas de suas experiências que potencializam importantes transformações no território e ajudam a melhorar a qualidade de vida de crianças e jovens paratienses.

 

Patrocínio

A Flip conta com o patrocínio oficial do Itaú e do BNDES, patrocínio da Petrobrás e apoio da CPFL, da Fundação Roberto Marinho, da Prefeitura Municipal de Paraty e do Instituto C&A. A Flip conta ainda com o apoio do Ministério da Cultura e do Governo do Estado do Rio de Janeiro por meio das leis de incentivo.

 

Canais de comunicação Flip
Site flip.org.br
Facebook facebook.com/flip.paraty
Twitter @flip_se

Materiais disponíveis em
 ftp://FLIP2014:FLIP2014@remote.a4com



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segunda-feira, 23 de junho de 2014

SELEÇÃO: COMER FEIJÃO COM ARROZ...E CAMARÕES

Luis Turiba

 

Sou alérgico a camarões. Quando os comia, empolava todo. Parei de saboreá-los aos vinte e cinco anos, depois de muitas crises, vermelhidões e coceiras terríveis.

Na verdade, hoje nem mais gosto desse crustáceo. Enjoo até com o cheiro. Mas nem por isso, deixei de admirar quem se delicia com um prato de camarões e devora-os um a um até o fim.

A Seleção Brasileira vai entrar hoje em campo, no estádio Mané Garrincha, em Brasília, com fome. Garrincha tinha fome de dribles, de gols, de títulos. Seleção Faminta, principalmente de gols. Seleção Garrincha.

O time não deve sonhar com pratos sofisticados feitos à base de camarões. Vamos no simples: feijão com arroz. No máximo acompanhado de camarões com chuchu, prato bem brasileiro. Prato para ser devorado lambendo os beiços.

Se não for assim não tem jogo, não tem vitória, não tem classificação. De que adianta Hino Nacional em uníssono se os jogadores não se sentem famintos em campo. E a fome da Seleção Brasileira é de bola, de gols e de feijão com arroz.

A seleção nos deve mais. Investimos muito nessa galera, nesse Copa. Muito 10 por cento; muito superfaturamento, muita corrupção padrão FIFA.

Em campo, nada de gracinhas marqueteadas. Phoda-se a Fifa, phoda-se o cabelo do Neymar. Cadê aquele Fred que faz gol caído, deitado, de barriga? A hora é essa: agora ou nada.

Cada jogador é um brasileiro faminto, um nordestino vindo da seca, do sertão. A bola é nosso prato de comida existencial. Contra Camarões, os leões indomáveis da África, cada jogada será disputada como se fosse a última chance de matarmos nossa fome. Seremos mais famintos que os africanos. Não temos chances fora disso. Sejamos pois um time de Cameleões que se adapta e se arma conforme a ameaça; que sabe bailar rasteiramente por entre gravetos e gramados.

O time de Felipão já entra em campo perdendo de 1 a 0. Tem que ser assim pra que todos corram atrás da bola/prato de comida. Morde-la, devorá-la, engoli-la antropofagicamente.

Nada de ficar tocando bola como se tivesse saboreando um camarão com fricotes e dribles desnecessários. Sejamos camaleão engolindo a presa. Bola é garra. É fome, sobrevivência. Temos que partir pra cima, pra dentro, pro gol, pro prato de feijão com arroz.

Comer um prato, dois pratos, três pratos. Todos fundos, todos fartos, todos pátrios. Comer a brazuca camaleonicamente com Camarões e tudo. E que venga el Chile. Ou os holandeses de saborosas carnes.

Comê-lo-emos também.


sexta-feira, 20 de junho de 2014

Fwd: Orlando Senna - O lado escuro da bola


O lado escuro da bola

Por Orlando Senna

 

A FIFA está completando 110 anos de existência e vivendo o clímax de seus envolvimentos com a prática de várias modalidades de corrupção. A FIFA, Fédération Internationale of Football Association, foi fundada no início do século XX por representantes da Bélgica, Dinamarca, Espanha, França, Holanda, Suécia e Suíça para organizar torneios de futebol entre países. As primeiras Copas do Mundo aconteceram em 1930, 1934 e 1938, seguindo-se uma interrupção de 12 anos devido a Segunda Guerra Mundial. O torneio foi retomado em 1950 no Brasil e não aconteceram outras interrupções, o que significa que estamos vivenciando a vigésima Copa. Como quase em todas elas, a FIFA e o governo do país sede estão em conflito, no caso presente a presidente Dilma e Sepp Blatter, presidente da entidade, estão praticamente de relações cortadas.

O episódio mais marcante dos conflitos FIFA/países sedes (que só afloram depois que o país é escolhido e começam as negociações práticas) aconteceu na Copa de 1986, que ia ser na Colômbia e aconteceu no México, que já havia sediado a de 1970. Foi uma decisão emergencial, frente a uma inesperada desistência da Colômbia e o que vale lembrar é a justificativa apresentada pelo então presidente colombiano Belisario Betancur: "não se cumpriu a regra de ouro de que a Copa deve servir à Colômbia e não a Colômbia servir à multinacional FIFA. Não há tempo para atender às extravagâncias da FIFA e de seus sócios".

As conhecidas extravagâncias, que nesta Copa do Brasil foram apelidadas "padrão FIFA" e geraram insatisfação popular. O governo brasileiro anunciou que os gastos públicos com a Copa serão de cerca de 12 bilhões de dólares (25.6 bilhões de reais) e que, além da grande propaganda planetária do Brasil, os investimentos em infraestrutura significarão importante retorno para a população. A FIFA diz que gastou 2 bilhões de dólares mas não declarou o que vai receber ou já recebeu pela venda dos direitos de imagem dos jogos, pelo licenciamento de produtos e dos patrocinadores. Vale lembrar que a FIFA é uma organização sem fins lucrativos, conformada por federações futebolísticas de 209 países.

A corrupção se manifesta de maneira mais expressiva na engrenagem através da qual os países são escolhidos como sede. O escândalo da vez são subornos a dirigentes da FIFA para que Catar fosse eleito sede da Copa de 2022. Catar é um emirado absolutista, acusado de usar o trabalho escravo de imigrantes, com o maior índice de mortes de trabalhadores imigrantes do mundo, não tem tradição futebolística, não tem estádios mas tem muito dinheiro. Na semana passada o craque alemão Beckenbauer, campeão do mundo como jogador e como técnico, membro do Comité Executivo da entidade, foi proibido de participar de qualquer atividade futebolística por 90 dias por "motivos éticos", "por se negar a cooperar com a investigação de corrupção na escolha de Catar".

O interessante é que a própria FIFA é quem se encarrega de investigar acusações contra seus dirigentes e, claro, não dá em nada a não ser em uma pequena maquiagem no fato. Bom exemplo é o de João Havelange, o brasileiro que "modernizou" a FIFA durante sua gestão de 24 anos como presidente. Segundo a Justiça suíça, Havelange e seu genro Ricardo Teixeira, presidente da federação brasileira, receberam propinas da Adidas no valor de 45 milhões de reais e devolveram apenas cinco milhões e ficou por isso mesmo.

Não vou fazer lista de corruptores passivos e ativos da FIFA, qualquer pessoa medianamente interessada em futebol conhece o assunto, que, aliás, não sai da mídia. É um mundo misterioso de cartolas internacionais e intocáveis que, ao mesmo tempo, fazem acontecer o maior espetáculo da Terra, promovem negociatas ilegais e gigantescas com governos e empresas e gozam de impunidade. Em vez de fazer uma lista longuíssima, prefiro expor a mentalidade de dois desses cartolas, o suíço Sepp Blatter, e o francês Jérôme Valcke, secretário geral da entidade e negociador da Copa do Brasil. 

Para mostrar como pensam basta uma frase de cada. Sobre a questão do Brasil mudar a lei que proibia bebida alcoólica nos estádios, porque a FIFA tem um contrato com a cervejeira Budweiser, Valcke disse, em entrevista coletiva: "talvez eu pareça arrogante mas isso não negociamos, deverá estar na lei o fato de que nós teremos o direito de vender cerveja". O governo obedeceu, o álcool voltou aos estádios, Valcke mostrou seu poder, bateu o pau na mesa. Blatter, na CNN, dando uma ideia para tornar o futebol feminino mais popular: "elas devem usar calções mais curtos". A questão é: como parar (afastar, processar, prender) esses poderosos meliantes machistas autoritários e continuarmos tendo as Copas do Mundo, amadas por bilhões de pessoas? Não sei a resposta, mas ela deve existir. 

  http://refletor.tal.tv/tag/orlando-senna



quinta-feira, 19 de junho de 2014

Fwd: texto sobre o goleiro Ochoa

       BRASIL NA COPA

  Quem disse que seria fácil?

 

Luis Turiba

 

paredão, muralha, tranca-trave, aqui não entra

um goleiro com o corpo fechado é um gato preto numa encruzilhada onde a coruja dorme

é cabeçada, é bola no ângulo, é cara-a-cara, é bola no corpo

mesmo que ele pule prum lado, a bola vai bater na perna dele no outro

ou o atacante chuta pra fora: batata

não adianta: não passa nada. Nada, nada nada...nada mesmo

se um dia é do gol, outro é do goleiro

se ele está benzido por um sarava Azteca à base do carvão de um vulcão xicano; aí é que jogo vira peteca

...se passa, bola na trave

 

bruxalitas da nossa tribo congelaram por três vezes o nome do goleiro Ochoa no frízer das cervejas da torcida brasileira

depois da quinta defesa de gato no cio, resolveram queimar seu nome na vela de sete dias

deu em nada, quebra da banca

nem com mil chutes de Branco contra a Holanda essa bola jamais entraria naquela terça-feira

 

no México, em 70 do século passado, frente à Inglaterra, Pelé cabeceou a menos de um metro do gol, de cima pra baixo

a bola quicou rodou subiu rumou e goleiro Gordon Banks voou para a defesa indefensável, num dos lances mais geniais de todas as Copas

 

zero a zero é um placar histórico para a Seleção

empates não empatam campeonatos

aconteceram em 58, em 62 em 94

 

passou, venha quem venha

um Maracanã nos aguarda

tomara que estejamos em campo

e o nosso goleiro tenha um dia de Ochoa

 


segunda-feira, 16 de junho de 2014

RIO NA COPA

INGRESSO PARA O FINAL DA COPA ESTÁ A 15 MIL

 

Luis Turiba

 

Na semana passada um ingresso para o jogo final da Copa do Mundo, no Maracanã, marcado para 13 de julho, custava R$ 6 mil no mercado paralelo. Achou caro?

Agora, com o fechamento da primeira rodada da Copa e já com alguns favoritos sendo apontados – Alemanha, Holanda, Brasil, Itália e Argentina - um ingresso para a finalíssima está cotado a R$ 15 mil. Há quem pague? Claro, é a lei da oferta e da procura. O ingresso é quente, verdadeiro e garantido e quem deixar para adquiri-lo somente nas oitavas-de-final, vai ter que desembolsar algo em torno de vinte mil reais. E tem muito ingresso no câmbio negro para a festa final da Copa.

A FIFA tentou de todos as maneiras impedir que ingressos circulassem livremente no mercado livre do Rio de Janeiro. Não conseguiu. Os que foram vendidos pela internet têm os nomes dos compradores impressos e tal. Mas milhares de ingressos fazem parte dos negócios do patrocinadores. Os trabalhadores das empresas que reconstruíram o Maracanã e as outras arenas também negociaram ingressos como parte de seus ganhos. Afora isso, muitos ingressos saíram diretamente da FIFA para esses mercados. É um grande negócio que tem como centro o Rio de Janeiro.

Mais de 50% dos milhares de argentinos que vieram ao Rio para o primeiro jogo contra a Bósnia, chegaram aqui sem ingressos. Quem não comprou com antecedência por cerca de 200 reais, pagou na semana passada algo em torno de R$ 800,00 e na véspera do primeiro jogo no Maracanã o ingresso estava sendo vendido a R$ 2 mil.

No último fim de semana, quem quisesse comprar ingresso para o jogo do Brasil contra o México, em Fortaleza, teria que desembolsar cerca de R$ 1.800,00. Para o jogo do Brasil contra Camarões, em Brasília, o ingresso está por esse preço. Se o cliente estiver na capital, o ingresso segue via Sedex.    

 

domingo, 15 de junho de 2014

BRASIL NA COPA

VAI TER PENALTI

 

Luis Turiba

 

Juiz não rouba: juiz se engana. 

Neymar jogou melhor que o juiz japonês Yuichi (Arigatô Zen) Nishimura e Oscar jogou melhor que Neymar. Portanto, quem ganha ou perde jogos são os jogadores e não juízes. O Brasil ganhou porque jogou melhor.

Vou contar um caso histórico: na Copa de 62, no Chile, o Brasil perdia de 1 a 0 da Espanha. Pelé estava fora do jogo pois teve um estiramento muscular sério, que o deixou fora da competição. No seu lugar, entrou Amarildo. Lá pelas tantas, um atacante espanhol invadiu a área brasileira e driblou o lateral Nilton Santos. Ficaria sozinho frente a frente a Gilmar e certamente marcaria 2 a 0. Nilton Santos deu um toco e ao ver o espanhol desabando no chão, deu um passo à frente saindo da área. O juiz marcou falta no que seria um pênalti. A falta deu em nada e o Brasil virou o jogo: 2 a 1, dois de Amarildo. Fomos bicampeões do mundo.

Juízes vivem errando. O erro faz parte da paixão do futebol. Erros bestas, erros grosseiros, erros esquisitos. Nessa Copa, como em outras, juízes vão errar em todos os jogos. Erros já deram títulos a Inglaterra e a Argentina. Lembrem-se do gol "mão de Deus" de Maradona!

Quem não poderia ter errado ali, naquele momento, era o Fred. A virada do jogo dependia dele. E ele fez o que tinha de ser feito. Bastou aquele beque croata tocar firme no seu ombro, naquele puxa-puxa dentro da área, que Fred desabou com tamanha arte e artimanha, que o olhar puxadinho do japonês viu o pênalti, como todos nós vimos também. No futebol, o que vale é a cena-viva. Replays não contam.

Foi o pênalti do caboclo "Sai da frente". Pênalti espiritual, de encruzilhada mangalô três vezes; pois pênalti não se marca tão somente quando as faltas são claras, óbvias e verdadeiras – ou não. Futebol não é matemática. É pura emoção, tesão e tensão. Ninguém ganha uma Copa do Mundo sem manha, macumba e malandragem. Fred sabe disso. E a Fifa também. Tecnologia, por enquanto, só para sabe se a bola entrou ou não. Faltas são diferentes e há um cardápio infinito desse tipo de jogada. Há a falsa, a cavada, a não-declarada, a dissimulada e até a falta de vergonha. Tudo depende do subjetivo e da posição do juiz.

Não foi bem o caso desse pênalti. Se a falta não tivesse existido, o goleiro croata Sinusite certamente pegaria o chute de Neymar, pois os deuses do futebol jamais perdoariam tamanha injustiça. Como o Sobrenatural de Almeida nem sempre está do nosso lado, fica o dito por não dito e bola pra frente que outros pênaltis virão: contra ou a favor.    

quarta-feira, 11 de junho de 2014

RIO NA COPA (5)

Luis Turiba

 

Troca-troca na Estação Central do Metrô

 

Dia dos Namorados. Em algumas horas a seleção brasileira entra em campo e começa a nossa tão polêmica Copa do Mundo – 64 anos depois do Maracanaço, um fantasma que ainda nos ronda. Portanto, a responsa é grande, galera: nada de jogo frouxo.

Senti nas ruas do Rio de Janeiro esse climão pré-estréia. Dava para ouvir um certo burburinho especial no ar: buzinas nervosas, crianças e camelôs soprando histéricas cornetas, todo mundo querendo chegar mais cedo em casa, pessoas comprando camisas e bandeiras para enfeitar janelas e carros. Enfim, vai ter Copa e vamos torcer. Afinal, apesar dos pesares, a seleção ainda é nossa eterna namorada.

O Rio está lotado de gringos. Alemães, colombianos, holandeses, americanos, portugueses, ingleses, japoneses, mexicanos e, pra variar, também argentinos. São ruidosos, escandalosos e vestem, com orgulho, as cores de seus seleções. A partir de hoje (dia 12, quinta) o Brasil é o centro do mundo e o Rio é o umbigo do Brasil.

Andando de metrô pude constatar – para nossa tristeza – que nem um banho de civilidade esse meio de transportes e locomoção de massas tomou para receber aqueles que vieram ao Rio para a Copa. Estações sujas, paredes imundas, chão xexelento e a confusão de sempre – mas ainda bem que estava funcionando, brasileiramente.

Diariamente passam pela estação Central do Brasil cerca de 50 mil  passageiros – uma movimentação extraordinária, onde se cruzam pessoas dos mais diferentes lugares que se movimentam de ônibus, trem e metro. E de repente, no meio daquela muvucada toda, surge à minha frente uma biblioteca chamada Estação de Leitura. Um projeto pioneiro e que merece foco, luzes e transparência de todos.

A Estação de Leitura se instalou na Estação Central do Brasil há pouco mais de um mês. É um projeto do Instituto Oldemburg, dirigido por Cristina Oldemburg, em parceria com o Metrô e a prefeitura do Rio. Já são mais de mil leitores associados e uma média de 60 livros emprestados por dia.

A bibliotecária Joanilda Santos e a secretária do projeto Ivanise de Moura entraram em clima de Copa. Vestiram um chapeuzinho verde-e-amarelo e celebraram o projeto Troca-Troca, onde leitores trazem livros de casa e trocam por outros que estão expostos na Estação. As vésperas do jogo de estreia do Brasil foram trocados seis livros. Entre os que foram levados, o escritor alagoano Graciliano Ramos foi o campeão, com dois exemplos: São Bernardo e Vidas Secas.

Pertinho da Estação Leitura há uma galeria de arte, onde quem se der ao trabalho de parar, verá uma belíssima exposição de fotos de grande Evandro Teixeira sobre o livro Vidas Secas.

Enfim, torcedores passam pela Central do Brasil na pressa da pré-Copa, brasileiros e estrangeiros, numa vibração que apenas se anuncia, enquanto uns poucos leitores param na Estação na possibilidade de uma boa leitura. Duas militantes da cultura lutam para dar visibilidade a um projeto que não tem padrão FIFA, mas que tem uma importância transcendental à da Seleção Brasileira, essa eterna namorada do povo brasileiro.

 

 

A SELEÇÃO ENTRA EM CAMPO E ESSE ARTIGO VALE A PENA SER LIDO

COM A SELEÇÃO, APESAR DA FRUSTRAÇÃO

                             Mauricio Murad, sociólogo

Pode ser um erro misturar a seleção com os desmandos e negociatas dos governos, do Comitê Organizador Local e dos cartolas. Se fosse certo fazer isso, não poderíamos jamais torcer e nem vivenciar a nossa maior paixão coletiva - seleção e clubes -, já que todos os poderosos tentam usar o futebol politicamente. Mas é bom não esquecer, que isto foi somente depois que o futebol conquistou a "alma popular", de uma maneira única e definitiva, a partir principalmente das décadas de 1930, 40, 50, 60 e se tornou o nosso maior evento de massas. O olho grande dos grupos dirigentes sempre cresce em cima de algo que seja muito popular. Assim, a equação é simples: o futebol antes de ser usado por aqueles que dominam a economia e a política, foi uma conquista, uma afirmação das camadas desfavorecidas da sociedade brasileira, fator cultural de resistência e de enfrentamentos simbólicos. A história do nosso futebol é um capítulo da história de nossas lutas sociais. Lutas de resistência, de inclusão, de inserção - social, racial, de renda, de escolaridade. Lutas de afirmação e tentativas, mínimas que sejam, de soberania da chamada "cultura popular", numa sociedade elitista, hierarquizada, preconceituosa e excludente, em seus fundamentos históricos, organização estrutural e modos de ser. Então, o futebol não é "deles", é "nosso". Mas, isto não significa que devemos esquecer ou deixar pra lá as chagas de nossa vida social, que ficaram muito evidentes com a Copa. Temos, sim, é que manter a nossa consciência viva e usá-la nas horas devidas e que bom que o futebol ajudou nesse sentido. Devemos ser contra a corrupção, a impunidade, as desapropriações, os acidentes de trabalho pelo corre-corre das obras, o super faturamento, a irresponsabilidade e todos os arranjos e conchavos de interesses privados e públicos, em relação à Copa do Mundo. É contra a corrupção, não é contra a seleção – proclamava com sabedoria uma faixa esticada nas manifestações de junho de 2013. A saúde, a educação, a justiça, o congresso, os governos no Brasil, infelizmente, são marcados pela corrupção e pela impunidade, mazelas históricas e estruturais de nosso país, colonizado e escravista por séculos. Nem por isso, podemos ser contra a saúde, a justiça, a educação etc. Temos que ser contra os descaminhos dessas instituições e a favor da punição dos protagonistas, mas não contra elas, que são componentes de uma sociedade democrática e de direito. O "pecado" não é do futebol ou de qualquer outro fenômeno cultural, mas do uso e do abuso políticos, que fazem dele. Por exemplo, Hitler usou a música de Wagner e o cinema de Chaplin (ideia de Goebbles), artes de destaque na história da humanidade e, claro, nenhum dos dois era nazista. Hitler e o Nazismo passaram e tanto Wagner quanto Chaplin são reverenciados sempre. E tem mais: A história e as pesquisas provam que vitórias esportivas não passam necessariamente para as urnas. Na Copa de 1998, levamos um chocolate da França na final (3x0) e mesmo assim FHC foi reeleito no primeiro turno, ao passo que em 2002, apesar de pentacampeões mundiais, na Copa Coreia/Japão, o mesmo governo FHC perdeu para Lula, o candidato da oposição.

Desde a Copa das Confederações, em junho de 2013, transformada em Copa das Manifestações, pela ação efetiva, independente e salutar das grandes multidões, que tomaram as cidades brasileiras, que tímida e lentamente alguns dos nossos principais jogadores "saíram da toca" e passaram a se manifestar. Primeiro foi o mais emblemático de todos, Neymar, que postou nas redes sociais: "Também quero um Brasil mais justo, mais seguro, mais saudável e mais HONESTO!!! Entro em campo inspirado por essa mobilização... Tamo junto." Agora, um ano depois, às vésperas do Mundial, além de Neymar, outros titulares como David Luís, Fred, Marcelo e Daniel Alves, cada um a seu jeito e modo, direta ou indiretamente, questionaram a impunidade, a violência, o racismo, as desigualdades. E isto sem falar no Bom Senso Futebol Clube, rica expressão no universo do futebol brasileiro, das manifestações de junho de 2013, embora sua gestação já viesse de antes.

A estrondosa e desconcertante vaia nas autoridades máximas do país e da FIFA, na abertura da Copa das Confederações, o hino cantado à capela pelas multidões de torcedores e o coro uníssono de "o povo unido jamais será vencido", em alguns estádios, mostrou um caminho interessante, para o "país do futebol". Além disso, revelou que pode não haver (necessariamente) contradição entre torcer pela seleção e se opor à corrupção. Muita gente que é contra as negociatas e os oportunismos, na hora h, talvez não consiga torcer contra a seleção. Foi assim no tricampeonato de 1970, em plena ditadura, que prendia, torturava, matava. Afinal, futebol é mais do que uma questão de governo e até mesmo mais do que uma questão de Estado, futebol é inconsciente coletivo, é identidade cultural, é patrimônio histórico. E tem mais: a indomável festa popular que vai pras ruas, se a seleção embalar de verdade, pode ser um espaço rico de denúncias, conversas e aprendizados recíprocos. Atuação firme, legítima e democrática, mas pacífica, o que aproxima e amplia os descontentes. O contrário pode afastar as pessoas e isolar os movimentos.

Por isso, torcer contra a seleção poderá ser um equívoco político, gerar o distanciamento e a aversão da maioria "alienada" contra a minoria "consciente". O fundamental é aproximar esses segmentos e deles retirar as aspas. O futebol é uma grande e simbólica oportunidade e a eficácia dos símbolos, muitas vezes, é maior do que a economia e a política. Enquanto as instituições de uma maneira geral, no Brasil, afastam de suas fileiras imensos contingentes da nossa população, o futebol aproxima. Não totalmente, como gostaríamos, mas satisfatoriamente, porque é um espaço e um saber legítimos, democráticos e populares. Com todos os problemas que tem - e não são poucos - o futebol, claro, não é panacéia, solução para os males das realidades brasileiras. Afinal, futebol é somente futebol. Se nem a educação, a justiça, a política, a ética, tudo junto não foi suficiente para superar as nossas profundas desigualdades sociais, de oportunidades, de renda, de acesso e de poder decisório, não seria o futebol a fazê-lo. Mas, se não pode transformar, pode ajudar ou, no mínimo, não atrapalhar.

segunda-feira, 9 de junho de 2014

Fwd: RIO NA COPA

Luis Turiba

 

Holandeses invadem nossa praia

 

Enquanto os alemães participam de pajelanças com os índios pataxós em Cabrália, sul da Bahia – coitados, a maldição do cocar é conhecidíssima entre nós, tupiniquins -; os holandeses estão cada dia mais acariocados.

Depois de mais um treino no campo do Flamengo, na Gávea, Robben, Sneijder e companhia foram pedir proteção a Iemanjá com um banho de mar no Leblon, com direito a caldos e muitas outras ondas. Saravá Van Gogh!

Aliás, os flamengos já chegaram ao Brasil tirando onda. Largaram as malas num hotel em Ipanema e foram imediatamente caminhar chutando ondinha atrás da famosa "Girls from Ipanema".

Quem estava lá na praia no último fim de semana curtindo aquele sol caidaço do outono carioca e testemunhou tudo, foi minha amiga, a poeta paraibana-candango Amneres. De repente, a poeta se viu atropelada literalmente por aqueles quase vikings – e alguns negões sabe-se lá vindos de onde. Fotografou tudo antropofagicamente. 

Mas é bom que se diga: holandeses merecem nosso respeito no futebol. Fomos eliminados por eles em 1974, na Copa da Alemanha, quando os adeptos do futebol-total – ou carrossel holandês, quem pode esquecer tão intenso balé -, tendo à frente o genial craque Johannes Cruijff. Perdemos por 2 a 0. Na Copa da África do Sul, a mesma coisa: 2 a 0, com o goleiro Júlio César mostrando sua famosa mão-de-alface em um dos gols holandeses. Vencemos a Holanda em 1994 por 3 a 2, na semi-final, com aquele golaço de falta do lateral Branco, quando Romário, num lance genial, tirou a bunda da reta e a bola passou zarpando rumo a rede holandesa.

De qualquer maneira sabemos que carne de holandês é gostosa. Ao expor seus corpos no paraíso tropical do Leblon, eles correm altos riscos, mesmo tendo uma esquadra da Marinha a vigiá-lo em alto mar. E aqui vale recorrer ao capítulo 2 do livro "Viva o Povo Brasileiro", de João Ubaldo Riberto, cujo ambiente é datado de 20 de dezembro de 1647.  Diz o texto:

"O caboco Capiroba apreciava comer holandeses. De início não fazia diferença entre holandeses e quaisquer outros estranhos que aparecessem em circunstâncias propícias, até porque só começou a comer carne de gente depois de uma certa idade, talvez quase trinta anos. (...)Saiu para tentar a sorte meio sem esperança e voltou arrastando um holandês louro, louro, já esquartejado e esfolado, para livrar o peso inútil na viagem até a maloca.  O flamengo tinha o gosto um pouco brando, a carne um tico pálida e adocicada, mas tão tenra e suave, tão leve no estômago, tão estimada pelas crianças, prestando-se tão versatilmente a todo uso culinário, que cedo todos deram de preferi-lo a qualquer outro alimento, até mesmo o caboco Capiroba, cujo paladar, antes rude, se tornou de tal sorte afeito à carne flamenga que às vezes chegava mesmo a ter engulhos só de pensar em certos portugueses e espanhóis que em outros tempos havia comido, principalmente padres e funcionários da Coroa, os quais lhe evocavam agora uma memória oleosa, quase sebenta, de grande morrinha e invencível graveolência".

Assim como a França e o Uruguai, a Holanda também deve ser considerada um "fantasma" pela nossa seleção canarinho. E os caras estão gostando da nossa praia.

É. Tomara que o caboco Capiroba esteja solto pelos campos dessa Copa do Mundo num Brasil que não consegue ser padrão FIFA. Macunaíma nos proteja.

quinta-feira, 5 de junho de 2014

BORGES, FUTEBOL E AMOR


 

"Nadie rebaje a lágrima o reproche

Esta declaracion de la maestria

De Dios, que com magnífica ironia

Me dio a la vz los livros y la nocha"

                             Poema de los dones


Luís Turiba*

 

 

Jorge Luís Borges morreu em plena Copa do Mundo de 1986. Não há texto seu conhecido sobre a arte do futebol – uma das sete maravilhas labirínticas do mundo contemporâneo.

Há alguns anos, prosando sobre um desses "tira-teima" da TV com o poeta Augusto de Campos, ouvi dele um comentário sobre o gol que Pelé não fez contra o Uruguai na Copa de 70 – sem dúvida um lance geométrico e bastante poético.

Augusto me chamou a atenção pela declaração inusitada: "Borges, que não enxergava, diria que a bola não entrou porque a jogada perderia o mistério, seu ar de eternidade." Concordei. A jogada de Pelé foi realmente um lance de dados mallarmáico.

Fiquei então matutando: como um "tira-teima" global, com toda a precisao hansdoneana, poderia resolver a antiequação matemática que Borges nos apresenta no conto-poema zen "Argumentum Ornithologicum", publicado no livro  O" Fazedor".

São tantos os labirintos, diria Roberto Carlos – não o ex-lateral da Seleção, mas aquele que censurou sua biografia não autorizada. Mas de todos os detalhes, el viejo e brujo amor é o que mais está entrelaçado nas cercanias do sem-fim.

Antes de morrer, num subúrbio de Montevidéu, Borges concretizou seu último poema secreto, quase uma jogada de Pelé. Por procuração, esposou sua bailarina Maria Kodoma, seu melhor hai-kai da escuridão, a menina que aos 15 anos já conversava com ele em irlandês. Maria, o caminho e os olhos de Borges. O amor aos 86 anos. Sua cara-visão nos caminhos de Veneza, numa biblioteca em Genebra, num balão na Califórnia, num café em Dublin.

Em fevereiro de 85, quando o entrevistei em Buenos Aires, graças a um recomendação do ex-presidente Tancredo Neves, Maria já era a parceira sempre companheira do mestre portenho.

"Eu e Kodoma estamos dirigindo uma coleção de 100 escritores. São 100 volumes, cada um com um prólogo. Para esse ediçãoo escolhemos aqueles de uma grata leitura. São 100 escritores e 100 prólogos. É incrível, mas tive que viver 85 anos para cumprir esse objetivo, um objeto de estudo(...) E com Kodoma vou publicar um livro chamado Atlas, com colagens, fotografias, recordações e textos curtos. É um atlas em livro com muitas partes do mundo: Irlanda, Inglaterra, Japão, Egito, Grécia, Califórnia. Muitos países e lugares...vamos ver."

Borges publicou pouquíssimos poemas sobre o amor. "Ausência" está em seu primeiro livro de poemas, "Fervor de Buenos Aires". Já "El Amenazado" é 1972 e está no livro "El oro de los tigres". Em ambos, o eterno labirinto do amor – acima dos livros, dos espelhos, das rosas amarelas, dos tigres, da própria visão e do gol-geométrico que Pelé não fez para eternizar a poesia do futebol.


Luis Turiba é poeta, ex-editor da revista Bric-a-Brac e editou QTais pela 7Letras