27.11.2009
| 14h45m
artigo
Obituário
Hoje pranteamos o falecimento do velho e muito amado amigo, Bom Senso, que conosco conviveu durante tantos anos. Ninguém sabe ao certo sua idade, já que seu registro de nascimento há muito desapareceu nos meandros da burocracia.
Ele será para sempre lembrado por ter cultivado lições valiosas tais como:
- saber quando se abrigar da chuva;
- porque Deus ajuda quem cedo madruga;
- a vida nem sempre é justa;
- e talvez a culpa tenha sido minha.
O Bom Senso vivia segundo regras econômicas simples e seguras (não gastar além do que se ganha) e estratégias confiáveis (os adultos, e não as crianças, estão no comando).
Sua saúde começou a deteriorar rapidamente quando regulamentos bem intencionados, mas inconcebíveis, foram colocados em prática. Relatos de um menino de 6 anos de idade sendo acusado de assédio sexual por ter beijado uma colega de classe; de adolescentes suspensos da escola por usarem desinfetantes bucais após o almoço; e de uma professora despedida por repreender um aluno insubordinado, só pioraram sua condição.
O saudoso Bom Senso começou a perder sua saúde quando os pais atacaram os professores por fazer o trabalho que eles mesmos tinham deixado de fazer, ao não disciplinar seus filhos rebeldes. Piorou mais ainda quando foi exigido das escolas que obtivessem assentimento paterno antes de aplicar uma loção de proteção solar ou um band-aid em um aluno; e quando lhes foi proibido informar aos pais que uma aluna estava grávida e pretendia abortar.
O Bom Senso perdeu a vontade de viver quando os Dez Mandamentos passaram a ser politicamente incorretos; quando as igrejas se transformaram em negócios; e quando os criminosos passaram a receber melhor tratamento que suas vítimas. O Bom Senso sofreu muito quando soube que você não pode se defender de um assaltante dentro de sua própria casa e que o assaltante pode processá-lo por agressão.
Finalmente ele desistiu de viver depois que uma mulher não se deu conta que uma xícara de café fumegante estava quente. Ela deixou cair um pouco do café no colo e em seguida pediu e recebeu uma enorme quantia como indenização.
Bom Senso já perdera os pais, Verdade e Confiança, a mulher, Discrição, a filha, Responsabilidade, e o filho, Razão. Deixa quatro meio-irmãos: Conheço Meus Direitos; Quero Isso Já; A Culpa Não é Minha; Sou Uma Vítima.
Poucas pessoas compareceram ao seu funeral porque muito poucos perceberam que ele morreu. Se você ainda se lembra dele, passe isto adiante. Se não, junte-se à maioria e não faça nada.
Esse obituário que o venerando The Times inglês, também conhecido como London Times, publicou lá pelo ano de 2007, é uma peça, a meu ver, antológica. Um amigo, Luiz C. Lemos, o enviou para mim ontem e eu imediatamente corri aos arquivos do jornal para verificar a data em que isso foi publicado. Desculpem, mas como ainda procuro seguir as regras do Senhor Bom Senso, não quis pagar as ₤4,95 pelo direito de pesquisar por um dia (aos interessados: por um mês, ₤14.95; por um ano, ₤74.95!) e portanto fiquei sem poder dar essa informação a vocês.
Mas se quiserem verificar o texto no original, basta entrar no amável Mr. Google e digitar "London Times Obituary of the late Mr. Common Sense" que encontrarão um sem número de entradas com esse magnífico texto. Também, se preferirem, podem lê-lo em http://www.democracyforum.co.uk/talk-about-anything/46015-death-common-sense.html, que recomendo.
O Bom Senso no Reino Unido passou por provações na área escolar que nós aqui, pelo menos aqueles que não têm filhos nas escolas inglesas ou americanas, desconhecemos, já que nossos filhos não entram de manhã e saem á tarde... Mas quanto à parte da disciplina, o Bom Senso aqui no Brasil também perdeu a batalha; ai do professor que der uma nota baixa, reprovar um aluno ou botar um pestinha de castigo!
Quanto ao restante do texto, talvez aqui aquela senhora distraída levasse muitos anos para receber a indenização; e pode ser que o assaltante não pudesse acionar o dono da casa que assaltou, mas não estou muito segura dessa informação.
As outras perdas que ele sofreu naquela linda ilha onde a grama é a mais verde do mundo, aqui ele sofreu em dobro. Sua família de sangue foi igualmente dizimada e seus sucessores também são os alopradissimos Conheço Meus Direitos; Quero Isso Já; A Culpa Não é Minha; Sou Uma Vítima.
No entanto, como aqui o controle de natalidade não existe, ele deixou mais dois meio-irmãos: Eu Não Sabia e A Culpa É da Imprensa.
Peço o mesmo que o London Times: quem sentir falta do Bom Senso, passe adiante esse texto como homenagem a um grande sujeito.
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