segunda-feira, 8 de agosto de 2011

UMA JAPONESA NO MUNDO DO SAMBA


Eu sou japinha, eu sou japinha
 
"Bashô, Bashô o santo
Agora todo Japão é banto
África, olhai em si
O que não hai-kai é oriki"
 
Por Luis Turiba
 
O poeta antropofágico Oswald de Andrade proclamou como fundamento de berço do modernismo brasileiro: a alegria é a prova dos nove e o carnaval do Rio o acontecimento religioso da raça. Se do outro lado do mundo a terra treme, aqui ela ferve.
 
Mas convenhamos: terremoto é algo estranho para nós viventes dos tropicos. É aquele trelelê repentino na vidade seres humanos, algo assim capaz de colocar multidões repentinamente frente a frente com a Dona Morte. Imagine! Sem menos nem mais, a terra se abre aos nossos pés e perdemos a noção do chão e a razão do equilíbrio. Tudo em volta se transforma em um labirinto engolidor do que há em volta. Nossa, deve ser punk! As coisas vão e vêm, não em vão. Prédios, postes, estantes, paredes, tudo chacoalhando como avião em turbulência infinita. O não-equilíbrío é o que é. As coisas fora da régua, do compasso, do esquadro. Só em pensar suamos frio.
 
Essas estranhas conexões podem até parecer doidas, mas vamos juntar os dois mundos: onde a terra ferve e onde ela treme. Quero aqui lembrar da minha amiga Masako Tanaka, a Mako, a japinha com sotaque carioca. Ela conhece bem esses dois mundos e sua pessoa é uma espécie de ponte entre eles.
 
Mako  nasceu, cresceu e viveu o terrível terremoto de Kobe, Japão, em meados dos anos 90. E porque a terra tremeu na sua vida, ela veio conhecer a terra que ferve e aqui reencontrou a alegria de viver, tocar, dançar e cantar. A tristeza de um terremoto a fez descobrir a alegria do samba.
 
Quando o terremoto passou ela descobriu que a vida é por um triz. Decidiu ser cantora. Mako entrou numa loja de disco no Japão e comprou um bolachão com uma capa linda, uma mulher belíssima vestida de branco, com turbantes de conchinhas de cabeça. Era Clara Nunes e Mako não sabia uma palavra sequer em portugues, mas a emoção de ouvir "Rainha do Mar" a fez chorar por dias e dias seguidos.
 
A partir daí, além da música, Mako se apaixonou também pelo samba brasileiro e correu atrás do destino que o terremoto lhe apontou. Hoje, completamente enturmada na vida musical carioca, ela mora na Lapa, toca caixa na banda "Mulheres de Chico" e também no grupo "Exalta Rei". Vez por outra é chamada para participar do Monobloco.
 
A conheci cantando "O Gago Apaixonado" de Noel Rosa, num show no CCBB de Brasília. Passou a ser uma consultora do projeto "Samba no Japão", direção de Maxtunay, da agência IN9, que tem financiamento do FAC/DF.
 
Desde o início deste ano, quando o Japão foi abalado por um novo e grande terremoto seguido de tsunami, fenômeno natural que derrubou usinas nucleares, como a de Fukushima; Mako quis voltar ao Japão para cantar, fazer palestras para jovens, mostrar que existem saídas. "´Preciso animar meus compatriotas".
 
Os japoneses são apaixonados pela música brasileira, especialmente a bossa nova e o samba. Mako é uma representante viva dessa paixão nipobrasileira. Vê-la tocando e cantando no "Mulheres de Chico" é algo extraordinariamente encantador. Ela sorri o tempo inteiro, tocando e dançando músicas de Chico Buarque. E para surpresa geral, canta "A Banda" em japonês. Um delírio.
 
Finalmente Mako viajou este mês para Tóquio, onde acompanhará as filmagens sobre desfiles de samba na Festa das Cerejeiras, que acontece há vinte anos no final de agosto. Em função da grande tragédia do início do ano, alguns desfiles foram suspensos, mas o samba irá rolar mesmo assim em casas noturnas como a famosa "Praça XI", em Aoyama. O Brasil, via música, apoia a reconstrução do Japão. Mako está em Tóquio, sacudindo a poeira, tomando saquê, cantando samba e comendo sushi. A terra vai ferver no templo das gueixas e dos samurais.
 




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