terça-feira, 19 de abril de 2011

POLÍTICA NA MUVUCA: BOÊMIA, MÚSICA E DISCURSOS

 
Por Luis Turiba

Carioca que se preza tem aquela marquinha na pele. Em   cima e embaixo. Isso faz parte da cultura da praia. Quanto menor o biquíni,   melhor a marquinha. E digamos que isso também é um rito quase que político do   mulherio do Rio, pouco importando o volume da massa corpórea, a idade, a   nacionalidade, o nível social ou econômico. De Ramos ao Leblon o negócio é   cultivá-la, pois certamente será usada como objeto de sedução.

Noite da última sexta-feira, lua quase cheia de um dia   ensolarado de outono. A Lapa fervia. Sem dúvida, é no velho bairro central que   hoje pulsa o point mais quente do Rio de Janeiro. Galeras circulam em   busca de diversão e arte. Casais de todos os tipos fazem estilo. Gringas e   gringos, nórditos ou latinas, nipônicas e argentinas, misturam-se com lúpens,   drogados, catadores de latinhas e vendedores de caipivodkas e hot-dogs   viralatas. O borburinho levava a crer que o bicho ia pegar.

Foi nesse clima de muvuca boêmia com marcas de um verão   que teima em não ir embora, que o PSTU carioca, um aglomerado político que   prega o socialismo moreno e faz passeatas com uma mini bateria de samba,   resolveu dar a luz a um ato de protesto inusitado e, talvez, até inédito.

E assim, ao contrário do que pregou FHC no seu   artigo-testamento, os caras "cairam pra dentro do povão" e montaram um fuzuê   na calçada da Rua Joaquim Silva, Alto da Lapa, bem próximo as escadarias de 10   mil azulejos que leva a Santa Teresa, onde circulam milhares de pessoas.

Instalaram ali um pequeno palco com potentes caixas de   som, e a dona música reinou até altas horas da madruga: rock paulista, reggea,   funk e, como não poderia deixar de ser, muito samba e pagode. Todos sabem que   são caros os shows das grandes casas da Lapa - média de 30 reais por pessoa.   Assim, o PSTU bancou "de grátis" uma bela noitada.

Enquanto militantes sacudiam bandeiras vermelhas, outros   faziam inflamados discursos relâmpagos contra o governador Cabral que mandou   processar 12 jovens e uma senhora, todos presos numa passeata anti-Obama no   mês passado. São acusados de destruição do patrimônio público. Mas os "pstus"   juram que foram punks infiltrados que jogaram coquetéis molotovs no consulado   norte-americano. Nesse disse-me-disse aconteceu a maldade: a polícia carioca   escalpelou os militantes que sairam da cana sem um fio de cabelo na cabeça.

A grande atração da manifestação foi o compositor   Barbeirinho do Jacarezinho. Ele tem um estilo único e debochado de compor,   brincando sempre com as necessidades dos trabalhadores. Catorze de seus sambas foram gravados por Zeca Pagodinho e pelo menos uns 10 por Bezerra da Silva. Lá pelas duas, com o público embalado por biritas coloridas e muita cerva, seus sambas soavam como verdadeiros hinos para aquele povão festivo.

Barbeirinho perguntava: "Você sabe o que é caviar?" A   massa respondia: "nunca vi, não comi, eu só falar". O povo ajudou a cantar   "Moro numa comunidade carente", "Dona Esponja", "Conflito" e outras. O melhor,   porém, foi quando ele levou "Pão Careca", samba que caiu como luva para aquela   reunião. A letra diz: "Dona Maria foi a padaria e achou cabelo no pão careca". Genial.

 Se FHC estivesse ali por perto sentiria oomo é   prazeroso fazer  política também com marquinhas na muvucas. Coisas de povão.

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