Luis Turiba
UMA HISTÓRICA ENTREVISTA COM JOSÉ MINDLIN
A entrevista que nós, os quatro editores da revista Bric-a-Brac – João Borges, Lúcia Leão, Resa e eu –, fizemos com José Mindlin, acho que em 1988, nos valeu três visitas ao santuário livresco, na época com pouco mais de 20 mil livros, sendo que 100 edições diferentes de “Os Lusíadas”.
Aconteceu uma coisa curiosa na época, o que enriqueceu em muito a entrevista, que depois serviu de base para seu livro “Uma vida entre livros”. Passamos um dia inteiro conversando e gravando. No final, o gravador não gravou bulhufas. Genial! Quando voltamos para a nova conversa, foi mel no mamão poder compreender melhor aquele universo envolvente de raridades.
Fui surpreendido hoje pela notícia do “Bom Dia Brasil” de que um robot está escaneando a “brasiliana” de Mindlin para torná-la pública, na internet. Ual!
NOTÍCIA DO BOM DIA BRASIL
“Colecionador doou seus livros raros à USP. Um robô "devorador de livros" está escaneando os exemplares. A paixão de um brasileiro por seus livros em breve vai ser compartilhada com todos nós. A Universidade de São Paulo se prepara para receber parte da biblioteca Brasiliana, doada pelo empresário e colecionador José Mindlin.
A “Brasiliana” poderá ser acessada de qualquer parte do mundo, pela internet, e também fisicamente, em um prédio que está sendo construído para receber o acervo. Um tesouro, de um homem sonhador, que vai se tornar público pelo esforço de gente que acredita que um grande país só se faz com cultura e educação.
“São três andares de livros. Todas as paredes com toda coleção exposta. A ideia é que a gente tivesse sempre o visitante em contato com o acervo”, explica o arquiteto Rodrigo Mindlin Loeb.
Este será o corpo da Brasiliana, biblioteca formada por 17 mil títulos, todos sobre o Brasil ou feitos no Brasil, doados à USP pelo avô de Rodrigo, o empresário e bibliófilo, José Mindlin.”
DEZ CONCEITOS DE MINDLIN SOBRE LIVROS
Em função de notícia tão fascinante, revisitei a entrevista de Mindlin à Bric-a-Brac que curti, me surpreendi, me emocionei. A conversa, muito bem ilustrada com fotos e reproduções feitas por Ricardo Chaves, ocupou sete páginas da revista. Aqui, só pra dá um gostinho a vocês, leitores deste blog, selecionei cinco grandes toques mágicos sobre este homem exemplar, brasileiro coberto de sabedorias e dignidades.
APRESENTAÇÃO
“Ele é um leitor insaciável. Indisciplinado confesso. O apetite pela leitura e um assumido perfil por raridades guiaram o rumo da biblioteca. Lê mais de um livro ao mesmo tempo, aproveitando ao máximo os pequenos intervalos. Como tem motorista, não se aborrece com engarrafamentos de trânsito em São Paulo: são algumas páginas a mais que lê. Quando sai do carro leva consigo os livros: “Se roubarem o carro não interrompo a leitura”, diz. (trecho da apresentação da entrevista, por João Borges)
COLEÇÃO DE CAMÕES
“No meu caso, a Camoneana começou pequena, e foi crescendo no tempo, com edições críticas e comentários que são indispensáveis à boa leitura de “Os Lusíadas” e até mesmo de outras obras de Camões. Na medida em que começou a surgir um conjunto significativo, foi inevitável a vontade de ir conseguindo as principais edições, seja pelo texto, pois há variantes, seja pelos comentários, pela ilustração, pela apresentação gráfica, e, porque não confessar?, pela raridade, que é um componente importante do prazer.”
AMIZADE COM DRUMMOND
“O caso do Drummond. Meu relacionamento com ele foi uma das boas coisas que me aconteceram na vida. Creio poder dizer que fomos muito amigos, mesmo sem sermos íntimos. Nas conversas e nas cartas havia camaradagem, e houve episódios engraçados em que resistia de início a pedidos meus, como, por exemplo, a reedição fac-similar de “A Revista”, que ele achava bobagem de mocidade, ou a assinatura de uma carta dirigida ao Presidente João Figueiredo pedindo a criação do parque Ianomani a ser assinada por ele, por Antônio Cândido, por mim e por mais algumas pessoas.”
RECONHECIMENTO DE GUIMARÃES ROSA
“Mas voltemos ao Rosa (João Guimarães). Fizemos boa camaradagem e durante um mês corríamos juntos as livrarias de Paris, conversando durante as andanças sobre um mundo de coisas, mas nada que eu me lembre, muito sério. Mas ele não me impressionou muito, embora fosse sem dúvida inteligente, e tivesse bom senso de humor. Nunca me deu idéia de que fosse escritor. Ao mesmo tempo, tinha uma preocupação com roupa e aparência, um indefectível gravatinha borboleta que me dava uma sensação de futilidade e de vaidade. É verdade que Oscar Wilde dizia que quem não se preocupada com a aparência não pode ser levado a sério, mas creio que Rosa exagerava. (...) Passaram-se dez anos sem que eu pensasse no assunto, quando saiu “Corpo de Baile” e logo depois “Grande Sertão: Veredas. Aí a coisa começou a mudar de figura, pois lembrei-me de “Sagarana”. Li os três livros de uma arrancada, e nunca mais me separei de Guimarães Rosa.”
O ENCONTRO COM UM LIVRO RARO
“O coração bate mais forte. A emoção a gente sente, o que a gente não pode é deixar transparecer essa emoção diante de um livreiro, porque senão o preço pode subir...
O FUTURO DA SUA BIBLIOTECA
“Tenho um neto, Pedro, que sempre ouviu a gente falar em uma fundação. Quando tinha 9 anos (hoje tem 17) disse um dia à mãe dele: “O vovô nunca vai fazer essa fundação. Em primeiro lugar porque é preguiçoso – vejam só o juízo que ele faz de mim! – e em segundo lugar porque ele não vai querer se separar dos livros. Quem vai fazer essa fundação somos nós.” Devo dizer que isso me deixou animado...Sobre a preguiça, ele até que tem uma certa razão, mas mesmo assim, espero que o assunto não precise ser resolvido postumamente.”
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3 comentários:
Mindlin, por Luís Turiba. Maravilha!
Bom dia, Mindlin!
Bom dia, poeta Turiba.
Sempre,
Edna
Querido Turiba,
E incansável procurador de talentos, seu bricblog está cada dia mais rico e diverso. Adorei poder ler parte da entrevista histórica com José Mindlin, sem dúvida um grande brasileiro, que divide com seu povo esse amor incondicional pela literatura e lhe presenteia.
Também fiquei curiosíssima para ver - e ler - é claro, o novo livro de Zuca Sardan e embarcar nos seus mystérios.
Enfim, a gente vê no blog essa mesma efervescência que lhe moveu e lhe move, desde ãs edições da Bric-a-Brac, na década de 80. Brasília agradece.
Parabéns e viva a poesia,
Amneres
A minha idéia com o blog é promover um movimento da mesma intensidade da Bric-a-Brac. Por isso, vou revisitar sempre as edições históricas da revista
Luis Turiba
Editor
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