sexta-feira, 12 de junho de 2009

O AMEAÇADO

Jorge Luís Borges

 

É o amor. Terei que ocultar-me ou que fugir.

Crescem os muros de seu cárcere como num sonho atroz.

A formosa máscara está de volta, mas como sempre é a única.

De que servirão meus talismãs; o exercício das letras; a vaga erudição; o aprendizado das palavras usadas pelo áspero Norte para cantar seus mares e suas espadas; a serena amizade; as galerias da Biblioteca; as coisas comuns; os hábitos; o jovem amor da minha mãe; a sombra militar de meus mortos; a noite intemporal, o sabor do sonho?

Estar contigo ou não estar contigo é a medida do meu tempo.

Já o cântaro se quebra sobre a fonte; já o homem se levanta ao cantar de um pássaro; já estão obscurecidos os que olham pelas janelas – mas a sombra não trouxe a paz.

É, já sei, o amor: a ansiedade e o alívio de ouvir tua voz, a espera e a memória, o horror de viver no sucessivo.

É o amor com suas mitologias, com suas pequenas magias inúteis.

Há uma esquina pela qual não me atrevo a passar.

Já os exércitos me cercam, as hordas.

(Este quarto é irreal, ele não o conheceu.)

O nome de uma mulher me delata.

Me dói uma mulher em todo o corpo.

 

Tradução: Luis Turiba, 1998

 

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