terça-feira, 2 de março de 2010

MINDLIN FALA DE POESIA, DO ESTADO E DA EMOÇÃO DO LIVRO RARO

MAIS HOMENAGEM A JOSÉ MINDLIN: TRÊS RESPOSTAS À REVISTA BRIC-A-BRAC
 
O Senhor disse que Machado e Guimarães Rosa eram os dois maiores escritores brasileiros. Onde ficam Drummond, Bandeira, Cabral, os irmãos Campos e tantos outros? Onde fica a poesia?

 

(...) A poesia é um mundo à parte, que ocupa um grande espaço aqui em casa.  Falar em Os Maiores, aliás não é muito razoável, porque não há critério seguro para julgar. É mais questão de afinidade. Mas há os que certamente são grandes, como Bandeira ou Drummond, ou como João Cabral, Vinícius de Moraes, Cecília Meireles, Mário de Andrade, ou o recém revelado Manoel de Barros, para só citar alguns nomes entre muitos. A lista é enorme, entre brasileiros e estrangeiros, e às vezes há poetas quase ignorados com poesias admiráveis, como Maria Isabel, autora de A Criatura no livro Visão de Paz, uma das coisas mais lindas da poesia brasileira. Mas não se pode ficar só nos contemporâneos – Gonçalves Dias, Castro Alves, Álvares de Azevedo, Bilac, Vicente de Carvalho, são outras das minhas admirações. Eu gosto muito de ler poesia em voz alta, e felizmente a Guita gosta de ouvir, de modo que muita poesia já ressoou nesta casa. Dos estrangeiros a lista também é muito grande, desde Villon e Ronsard, até Paul Eluard e Aragon ou Octávio Paz, passando por Keats, Shelley e Byron, Baudellaire, Verlaine e Rimbaud, O Corvo de Edgar Poe, ou Balada da Prisão de Reading de Oscar Wilde, Rilke, Fernando Pessoa, e tantos, mas tantos outros! Só a poesia já daria para uma entrevista, mas acho melhor ir ficando por aqui, e só dizer que para mim a poesia tem imensa atração.

 

Como foi a sua experiência como Secretario de Cultura do Estado de São Paulo? Valeu à pena participar de um governo não democrático? Na sua opinião, qual deve ser o papel do Estado no processo cultural?

 

Para mim foi um desafio inesperado, que aceitei porque estava havendo, em 1975, um começo de abertura política, sem o que, obviamente, eu não iria colaborar com o regime autoritário. Lembro-me que, consultando a respeito a família e alguns amigos, entre os quais Antonio Cândido, ele me disse que deveria aceitar o cargo, porque naquela altura, se quem queria a abertura recusasse, o cargo seria ocupado por quem não o desejava. E acrescentou que não tinha dúvida em dar esse conselho por ter a certeza de que se não desse certo eu deixaria o cargo. Foi realmente o que aconteceu, quando comecei a sofrer pressões dos radicais da direita, mas devo dizer que não é fácil você deixar um cargo quando tem a sensação de estar fazendo um trabalho importante. Para me decidir, tive de imaginar duas alternativas possíveis: se eu me demitisse e depois houvesse a abertura, eu iria me arrepender; mas se eu ficasse e não houvesse abertura, eu iria me arrepender muito mais. Aí a decisão foi fácil, pois entre os dois arrependimentos preferi obviamente o primeiro. Mas a experiência foi fascinante, por ver o que se pode fazer quando se pensa só no trabalho, sem quaisquer ambições pessoais. O papel do Estado deve ser o de conservar o patrimônio cultural, o de indutor da cultura, sem pretender dirigi-la. E o importante é procurar estimular o surgimento de valores, criar coisas que deitem raízes, e não se contentar com o brilho do que seja efêmero, embora isso também possa ser importante. Outra coisa fundamental é não basear o financiamento da cultura no assim chamado mecenato do Estado. Toda a sociedade deve participar, em conjunto, com o Estado.

 

Qual é a reação imediata de uma pessoa que encontra, depois de 40 anos de procura, um livro raro?

 

O coração bate mais forte. A emoção a gente sente, o que a gente não pode é deixar transparecer essa emoção diante do livreiro, porque senão o preço pode subir...

 

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