segunda-feira, 30 de agosto de 2010

VAMOS REFLETIR UM POUCO SOBRE AS ELEIÇÕES

Nosso blog não tem tomado partido na corrida presidencial. Mas esse artigo de Miríam Leitão, que foi publicado no Diário de Pernambuco, traz boas razões para refletirmos sobre os caminhos futuros do nosso País.
 
Miriam Leitão

Falha da oposição

Baixo saneamento tem a ver com saúde e meio ambiente. Aumenta a incidência de doenças e a deterioração ambiental urbana. Dados do IBGE mostram que oito anos de governo Lula não reduziram a calamidade dos indicadores. José Serra, candidato da saúde; Marina Silva, da sustentabilidade, falam pouco do assunto e lutam para sair na foto ao lado de Lula.

O mais relevante numa eleição da perspectiva de um candidato é, evidentemente, ganhar a eleição. Mas da perspectiva do eleitor, o melhor é que se aproveite o momento para discutir os problemas e tirar dos candidatos compromissos para superá-los. A oposição tem a obrigação de falar tudo o que não está funcionando, apontar o dedo para todas as feridas. Para isso é oposição. Esse debate influenciará as políticas públicas independentemente de quem for eleito. Se a oposição se amedronta com os índices de popularidade do governante e não pode fazer seu papel, o país é que sai prejudicado.

Marina Silva, nas brigas dentro do governo por políticas públicas de proteção ambiental, encontrou uma sistemática e implacável adversária: Dilma Rousseff. Foi a ex-ministra das Minas e Energia e ex-chefe da Casa Civil que disse não a projetos de sustentabilidade, afastou Marina das decisões de projetos na Amazônia, engavetou a criação de áreas de proteção, revogou conquistas na luta pelo equilíbrio entre desenvolvimento e meio ambiente. Marina sabe disso. Sabe porque viveu. No dia do lançamento do primeiro PAC, enquanto o laser pointer de Dilma Rousseff cortava a Amazônia sem cerimônia, Marina se encolhia derrotada, longe do palco e perto da saída do governo. Mas até agora não disse isso ao eleitor. Não contou o que sabe e viveu. Não mostrou o risco para o meio ambiente que representa a vitória das ideias defendidas pela sua adversária. Se for resumir tudo o que ela disse nas entrevistas, debates e programa eleitoral não se consegue saber exatamente o que a fez sair do governo.

José Serra é líder de um partido, o PSDB, que já governou o Brasil por oito anos. Sabe onde foi que o governo atual errou e erra. Fala pouco desses erros. Prefere tentar o impossível: disputar com Dilma a sombra do presidente Lula. Ora, Lula fez sua escolha, sua candidata é Dilma Rousseff. Cabe aos outros fazerem oposição. Marina acerta quando ataca Serra, como fez ao apontar os erros da gestão tucana em São Paulo, no debate da Folha Uol. Esse é seu papel comoalternativa aos dois grupos que já governaram o Brasil. Erra quando poupa Dilma, sabendo tudo o que sabe. E erra porque está sonegando uma informação relevante ao eleitor. Marina nunca exibiria divergências de forma agressiva. Não é de sua natureza, nem aconselhável. Mas ser direta, clara e sincera sobre os riscos ambientais que o país corre, ela deveria ser, preservando o seu estilo elegante.

O Brasil está pegando fogo literalmente. O aumento dos focos de incêndio em todos os biomas não é coincidência. Há uma licença para queimar. Os riscos ambientais estão subindo assustadoramente. O Imazon divulgou um estudo mostrando que 29 áreas protegidas da Amazônia foram reduzidas ou extintas, entre 2008 e 2009, expondo à destruição um território quase do tamanho do Rio Grande do Norte. Coincide com o período em que o governo Lula afastou Marina Silva e deu maiores poderes a Dilma Rousseff. O estrago só não é maior porque por incompetência gerencial, a maior parte do PAC não saiu do papel, é só fumaça dos efeitos especiais para a campanha eleitoral.

Em saneamento, tucanos e petistas fizeram pouco, como tenho repetido neste espaço. Nos oito anos do governo Fernando Henrique Cardoso e nos quase oito do governo petista, os investimentos em saneamento básico foram baixíssimos. O Brasil tem dados vergonhosos para provar isso, como o IBGE acaba de divulgar: quase metade do país sem esgoto. A diferença entre os dois grupos políticos é que o governo Lula fabrica números falsos de investimento, e Dilma, confrontada com os dados verdadeiros, garante que os próximos indicadores serão bons. Aposta no mercado futuro de ilusões. Para aceitar como boa sua explicação é preciso acreditar que em 2009, ano de crise, o país deu um salto ornamental em saneamento básico, fazendo o que o governo Lula não fez em 2003, 2004, 2005, 2006, 2007 e 2008.

Nos últimos dois anos elevaram-se assustadoramente as ameaças ao projeto econômico que nos trouxe a estabilidade monetária. O risco não vem do Banco Central, mas sim da ampliação de gastos de custeio, da criação de estatais, da intervenção política nas estatais existentes, da atuação desordenada do BNDES. Nunca o patrimônio da estabilização, herdado pelo governo Lula, esteve tão ameaçado. José Serra, do partido que venceu a inflação no Brasil, é incapaz de alertar para esses riscos.

O que é ameaçador nas eleições de 2010 não é a vitória do governo. O eleitor brasileiro é que tem o poder de, coletivamente, decidir quem é o vencedor, e por esse poder, que emana do povo, se bateram os verdadeiros democratas. O ameaçador é consolidar políticas imprudentes. Por isso, a oposição tem que fazer seu papel, sem temer a popularidade do presidente Lula. Esse tipo de consagração vem e passa. O país fica.

Nenhum comentário: