segunda-feira, 21 de setembro de 2009

BEIJA-FLOR GANHA EXPOSIÇÃO NO PARQUE OLHOS D´ÁGUA

Madalena Rodrigues, Curadora

 No dia 17 de agosto, Tancredo coletava folhas secas para modelos de suas xilogravuras quando descobriu um ninho de beija-flor, com uma fêmea majestosamente posada. No dia seguinte voltou com um pequeno arsenal: a máquina fotográfica, a lente macro, a teleobjetiva, e uma escada de alumínio para chegar bem perto do ninho, a dois metros de altura. Pediu licença, aproximou-se com o coração levemente acelerado e sussurrou: "Beija-flor, fique tranquila. Não farei mal a você nem aos seus ovos queridos".

 Presença tacitamente aceita, o fotógrafo iniciou sua emocionada coreografia em torno do ninho. Fotografou o dentro e o fora, em cima, em baixo, e cedeu mais de uma vez à foto cega, fazendo chegar a lente onde o olho humano não alcança. Era acordar cedo, correr para o parque, equilibrar-se na escada, quase cair, e surpreender-se a cada dia. A altivez da beija-flor tornando-se mãe e a fantástica arquitetura do ninho. Confusão de pequenos galhos, folhas, sementes, liquens e musgos maravilhosos e teias de aranha! Essa parceira silenciosa e inusitada garante a amarração da morada, tornando-a ideal em suas dimensões, conforto, transparências e cores. Trama caótica e perfeita que desperta em nós humanos estranhamento e fascínio.

Veio o despertar do primeiro ovo. A beija-for? Vai e volta, muda de atitude, muda de posição, as asas já não cabem no ninho com a chegada do novo morador. É um animalzinho estranho. Em nada anuncia a iridescente beleza do beija-flor que será em poucas semanas. O segundo ovo não vingou, confirmando, como em tudo, alguma perda em meio a um ganho maravilhoso. Outro ninho será descoberto logo adiante, e depois outro e outro.

O Tancredo arquiteto e fotógrafo, em seus contentes 62 anos, vê-se novamente menino, como nos tempos de catar penas e ovinhos, nos barrancos do Juruá, no extremo Acre. Delicia-se com o enquadramento, a luz e o foco. Melhor no bico? Melhor no dorso? E a cada momento desse vôo, a memória lhe sussurra a lição de mestre Corbusier a nós humanos tão distraídos:

Não basta olhar. Mais importante é ver.

 

 

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